O TEMPO DALMA / DO SABER / DA POLÍTICA
O TEMPO DALMA I – 7 MAR 22
Sempre difícil é saber do tempo dalma,
quando se tenta desvendá-lo com a razão;
o tempo dalma é atoladouro de emoção,
que nos pode engolir em plena calma
ou ao contrário, um elixir que embalma
e lentamente nos envolve em ilusão,
porque o tempo dalma é coração,
nele a alegria e a tristeza agitam palma.
O tempo dalma é sempre inesperado,
quando nos chega, é como epifania,
que em todo o corpo o iluminar nos cria,
qual nova aura que nos brilha ao lado,
que se expande e em vibração se alia,
muito além de todo o mérito ou cuidado...
O TEMPO DALMA II
O tempo dalma rebrota do interior
ou nos é pelo exterior só demarcado?
Só quando surge se percebe foi achado,
mas não depende de qualquer pendor;
foi desenvolvido por nosso vigor
ou veio de alhures, sorrateiro e alado?
O tempo dalma é que nos tem caçado,
nessa emboscada que se chama amor?
O tempo dalma pode ser a voz de um anjo
a insuflar-nos um ardor espiritual,
que nos impele aos albores do entusiasmo
ou é resultado de um suave banjo
da voz que surge em vibração carnal,
só a antecâmara, afinal, do orgasmo?
O TEMPO DALMA III
O tempo dalma é uma esguia serpentina
que nos envolve num arcano festival,
muito mais amplo que um exíguo carnaval,
como um balanço que para nós se inclina
e gentilmente toda a carne nos domina,
seja apenas para qualquer amor sensual
ou o realizar de alguma obra triunfal,
com a qual alheia alma se fascina?
Ai, tempo dalma, como se o desconhece!
Não é possível se provocar o amor,
nem em obra de gênio se insistir
e nem sequer se ganha em qualquer prece,
mas quando chega, traz pleno esplendor,
quando quer e quando quis nos revestir!
O TEMPO DO SABER I – 8 MAR 22
Conhecimento é um altíssimo rochedo
que só aos poucos se presta a ser galgado;
se alguém no vale está localizado,
julga do mundo conhecer todo o segredo;
porém mesmo que levante-se bem cedo,
assim que a luz do sol tenha chegado,
pouco percebe que, nos píncaros alçado,
há muito o astro saiu de seu degredo.
Mas ao lançar ao redor sua vista airada,
cada detalhe de seu vale é conhecido,
mesmo o ribeiro que o corta tem seguido;
se a falta da montanha acaso é compassada,
quando achar que precisa esse penhasco
subir aos poucos, até sente um certo asco...
O TEMPO DO SABER II
Porém quem sobe a falda da montanha,
logo percebe seu mundinho se ampliar,
saber maior já tendendo a conquistar,
o antigo vale a seus olhos já se acanha.
Salvo quem tenha imaginação tacanha,
logo percebe haver mais a se alcançar,
a luz do sol mais cedo a se enxergar,
um certo ímpeto a realizar outra façanha!
E de repente, escalado esse penedo,
bem lá do alto, quanto se descortina!
Então se alarga o horizonte na amplidão,
metade em ambição, metade em medo,
o resultado de erguer-se essa cortina
e das certezas anteriores a evasão!
O TEMPO DO SABER III
Por isso, quem já chega quase ao alto,
ao ser louvado por ter sabedoria,
percebe bem, sem qualquer hipocrisia,
que isso que sabe é bem menos que o ressalto;
somente alguém de raciocínio falto
pensa saber bem mais do que sabia,
pois muito avista além do quanto havia,
que seu olhar só abrange em breve salto!
E quando dizem: “Só sei que nada sei”,
nada mais fazem que apenas constatar
como é amplo o universo a desvendar,
e de seu próprio horizonte não ser rei,
mas só divisam a fronteira da amplidão,
que certamente jamais contemplarão!
O TEMPO DA POLÍTICA I – 9 MAR 22
Nunca me interessei por política carreira,
meu pai e minha irmã eram nela encalacrados;
por suas ideias os meus atos respingados,
fui perseguido por gente interesseira;
nunca fiz compras direto nessa feira:
lutar por votos em palanques estressados,
desde o começo meus motivos caluniados:
realmente, não é coisa que se queira!
Considerando essa tradição premente
na busca infanda por se obter poder,
já grande parte traz em si a corrupção;
quem se comporta de qualquer forma inocente,
rapidamente se conduz ao corromper:
os que na lama pisam, respingados sempre são.
O TEMPO DA POLÍTICA II
Mesmo que fosse bem diversa essa tendência
e realmente patriotismo se encontrasse
em quem aos postos se candidatasse,
infelizmente, coisa bem rara essa potência,
existe o dolo em toda a interveniência,
toda a inveja e a picuinha dessa classe,
muita calúnia que no rosto se estampasse
de adversários, sem a menor clemência.
Pior ainda, quando as coisas andam bem,
há um impulso a criticar os melhores,
que o povo acredita ser o bem sua própria obra;
mas se as coisas desandam, igual se faz também,
que os governantes se acredita ser piores,
e por suas faltas, cada um, a quem governa cobra.
O TEMPO DA POLÍTICA III
Mas nessas críticas não existe honestidade,
causadas são, em geral, por ambição,
que derrubar se consiga de onde estão.
por qualquer meio e por qualquer maldade!
Com que frequência, até mesmo autoridade
do próprio partido, seus colegas, em ocasião,
vão atacando sem a menor inibição,
que lucros tenham nessa competitividade.
E o pior é que, não importa qual partido,
todos desejam só o poder se conquistar
e o povo serve tão apenas como escada!
Pois no momento do cargo conseguido,
seja quem for, só busca a si locupletar,
sem esforçar-se pelo povo em nada!