Último trago
O verso queima a mão que ora escreve
em letras, quase mortas, um soneto.
A cinza esconde a rima do terceto
na pedra sepulcral de triste verve.
O coração, parado, já não serve
pra propulsar o verbo pelo corpo,
que, vivo, foi poeta e hoje morto,
sofre ainda mais do que parece.
Se Deus pudesse ouvir em cada prece,
a tosse esfumaçada que enegrece
o derradeiro trago. A poesia,
volátil como o fumo do cigarro,
seria tão somente o pó do barro
que sobra do poeta, quando cria.