TRILHA DE SONETOS LVII - VERSOS DECASSÍLABOS EM PENTÂMETRO IÂMBICO, COM TRIO DE PALAVRAS: DENSA(S), ESPREITA e SINA

*ELEGIA N° 1*

Agora, sinto o fado frio que arde,

Amaina a densa chama – a sina; o fim.

Percebo, então, que nada vale um ar de

Soberba, pois a morte espreita e, assim,

Caminha o ser vivente à sua tarde.

Virtudes não impedem este sim

Que, certo e fido, o riso e o brio encarde.

Decai o sopro breve ao seu confim.

E, como paira, sobre o mar, a bruma

Que o tempo apaga e some pelo vento,

Também se esvai a vida como espuma.

"Oitenta são os anos:" diz o salmo,

Do horrendo ciclo langue e muito lento;

"Sabendo, calo a voz e aguardo calmo."

Eufrasio Filho

*BÊNÇÂO*

A aurora beija a noite assaz silente

e toma sobre si feroz porfia,

esparge toda a névoa densa e fria

que queda em mim, na derme, corpo e mente.

Se ruge a escura sina tão vilmente

e o medo espreita em hora tão sombria,

certeiro e crido, aflora um ledo dia

e neste instante sinto a paz de um crente.

No dia após a noite tem milagres,

então aceito os ritos tristes, agres

e faço deles bem que a vida enlaça,

pois se é sabido e certo feito a morte

que tudo passa, mesmo a amarga sorte,

degusto o amor e a dor na mesma taça!

Geisa Alves

*SOB A DURA PENA*

Relembro a todo instante aquela cena

Do beijo dado em ti, daquele abraço...

No enlevo, a tua mão, gentil, pequena

Unida às minhas mãos, no estreito laço!

Agora, sinto a densa e dura pena;

A morte vai roubando o nosso enlaço

Enquanto a vida, a mim, o azar condena

Viver sozinho, sem o teu regaço.

A parca sorte espreita e o sonho quedo

Traduz a minha dor, a minha sina

Prevendo o meu fracasso, tarde ou cedo.

Recorro ao Pai, conter o negro véu

E dar-me a luz que a todo ser fascina;

Em prece tenho o olhar voltado ao céu!

Aila Brito

*INSTANTE AMBÍGUO*

Contemplo o fim de tarde doce e lento,

Pensando sobre o início e fim da vida,

Nas mãos da Lei que rege o bom momento

De quem aprende com a própria lida.

O sol decai, a treva sobe, o vento

Ressoa grave, frio, em luz vencida

E em cada dia a sina brava enfrento

Na espreita, oculta e densa, à voz tremida.

Assim decorre o ciclo feito um raio,

Pois tudo nasce e morre e, então, recaio

No, sempre, oculto mundo, só, e absorto...

Reflito, enfim, e até de mim eu saio

Nos versos pelos quais sofri desmaio

Vivendo o instante ambíguo: vivo e morto!

Ricardo Camacho

*O RELÓGIO…*

O par de seus ponteiros cumpre a sina…

Exibe, em seu ballet de sons fecundos,

cadência audaz — umbral de tantos mundos —

que traz de volta sombra e luz divina.

Rumina, em seus rumores, voz menina…

Mastiga o tempo e arrota seus segundos:

cuspindo dores — cortes bem profundos —

lançando odores leves: mar, bonina…

Na densa dança, espreita… invade o espaço…

Badala e explode em “BLENS”, e assim desfaço

qualquer retalho meu em prosa e verso.

Relógio rasga as horas, rege a trova

(fingindo o mesmo pulso, o ouvido aprova),

mas sabe ser igual e tão diverso!…

Elvira Drummond

*CAMINHADA*

Reitero, Amor, que a fé jamais termina,

pois sinto Deus constante em cada aurora.

O pranto flui e a dor irá embora,

por isso avanço firme nesta sina...

Assim persisto e enfrento a audaz ruína,

que o nosso mundo intenso impõe agora,

mas sei que a Luz Sagrada não demora

e sempre o bem impera, o Eterno ensina!

Amor, a chuva triste desce densa

e, às vezes, rouba a paz, então espreita:

Segure a minha mão, na estrada estreita!

Esqueça o medo, não aceite a ofensa,

despreze aquele olhar atroz do algoz,

contemple a cruz... jamais estamos sós!

Janete Sales Dany

*A JUSTIÇA*

Existe gente densa em seu rancor,

Que espreita a vida alheia em busca do erro,

Que leva o mal ao outro até o enterro,

Pensando ser do mundo bom credor.

Existe gente cega a toda cor,

Que omite a triste sina ao ver desterro,

Que põe em frente ao sol um grande cerro,

Prefere não sentir nenhum frescor.

Quem põe a própria trave em sua mão,

Jamais com cisco algum será surpreso,

Pois faz brotar em si o seu perdão.

O injusto nunca sai do mundo ileso,

Alguém que aponta o dedo para o irmão

Também será julgado em mesmo peso!

Luciano Dídimo

*LAMÚRIAS CALADAS*

A densa névoa invade o quarto e deita

aquele antigo aroma sobre a cama,

instiga o louco, traz desejo, inflama

o grito pela história aqui desfeita.

Ainda preso ao lume desta chama

que toda noite surge e fica à espreita,

palmilho o sonho, encontro minha eleita,

acalmo a bruta angústia, venço o drama.

Lamúrias calam, olhos dizem tanto

do nosso amor perdido e esqueço o pranto,

a ausência, a vida insana nesta cela.

Enfrento austera sina, o peito iludo

porque respiro ardência e faço tudo

somente para estar ao lado dela.

Jerson Brito

*TRIBUTO AO BATRÁQUIO*

Os sapos têm o dom do canto e rima;

Capazes, usam regras duras, raras,

Que expõem do pré-moderno suas taras

Seguindo o bom Parnaso, põem-se acima...

De insetos vis punidos pelo clima

Brumoso, enfim sem luz, no qual declaras

Teu ódio e vês à espreita, nunca às claras,

Soneto ser chamado de obra-prima.

Na densa névoa até a própria sina

Não quer andar mudando a cada esquina,

Mas pouco importa, o novo fica antigo...

Se, bem tratado o velho dura mais!

No entanto, o fresco: não igual aos pais,

Terá por glória, apenas, seu umbigo.

José Rodrigues Filho