TRILHA DE SONETOS XLIX - Meio Ambiente ou Fome
*VERSOS RESSENTIDOS*
Soluça a Natureza em decadência,
Aos prantos ressoados pelos matos,
Sofrida, pelos filhos, por maus-tratos,
Queimada pelos golpes de indolência!
Desaba sobre nós a consequência,
O desgraçado peso dos seus atos...
Calamidades crescem, vide os fatos...
Espada irrefragável - Penitência!
A sociedade não preventa, em lide,
A Mãe do Verde sofre o mal, regride,
Torrando sobre o solo a própria vida!
A cinza trilha em plena dor progride...
Tremendo, o gemedor presente incide...
Triste cenário - Terra ressentida!
Ricardo Camacho
*SOS*
O espaço verdejante da floresta
Encolhe enquanto a chama avança e invade,
Ardendo a mata em viva claridade
Que o fogaréu, na cor do sangue, infesta!
Deitado o inferno feito um fim de festa
Mas, no contraste cinza da cidade,
Erguidos prédios, na tranquilidade
Do Ser em sonolência manifesta...
A cor de uma penumbra, desde a tarde,
Nos atos de demolição covarde
Que lançam várias árvores ao chão!
Sobe a fumaça e sinaliza o alarde,
No mundo inteiro a nuvem tóxica arde
Tal como o ser que sonha sem colchão.
Ricardo Camacho
*TRISTE LEGADO*
Chora a floresta imersa em fogo e chama,
choram os rios fartos de detritos
e chora o mar em cantos tão aflitos
enquanto a Terra em triste voz exclama...
Não é gentil, nem leda mas tem fama
a extensa e horrenda lista dos delitos,
desmandos e descasos infinitos
e o nosso lar em dores sofre e clama!
Cidades que sucumbem nas enchentes,
as águas que reclamam seu lugar
e os ares, poluídos e ferventes
seriam o legado a transmitir?
É tudo que podemos nós legar
às gerações futuras e ao porvir?
Geisa Alves
*A FOME*
O povo brasileiro está com fome,
Com fome de justiça e segurança,
Com fome de trabalho e de esperança,
O pobre já faz tempo que não come.
O rico já faz tempo que consome
Desenfreadamente na lambança
E sem nenhuma culpa na balança.
Toda fome tem nome e sobrenome.
A fome que corrói tanta barriga
Não dói na consciência do bom moço
Que não perde seu tempo nessa briga.
O povo acostumou-se sem almoço,
E o silêncio covarde não o instiga
A tirar essa corda do pescoço!
Luciano Dídimo
*AVAREZA*
A fome, suas dores e a pobreza
distinguem claramente os racionais
de todas outras classes de animais
privados do egoísmo e da avareza.
Como se fora a classe de imortais,
o acúmulo de lucros e a riqueza
os leva a nada mais do que à certeza
que os próprios homens criam seus rivais.
Se rondam pela noite os maltrapilhos;
se falta o pão na mesa a tantos filhos
e aos abastados falta consciência,
a iniquidade forja as suas vias,
prepara e fortalece suas crias,
envoltas pelo manto da indigência!
Edy Soares
*A MAIOR FOME*
Com indomável força, a natureza,
Em mil sussurros, gritos e gemidos,
Sucumbe aos homens vis, ruins, perdidos,
Que buscam destruir, sem ter nobreza.
E tudo por ganância, por riqueza,
Que matam nossos campos mais floridos.
Com isso, muitos povos oprimidos
Não podem pôr o pão na própria mesa.
Nosso ambiente encontra-se estafado,
Poluições deixaram o ar pesado,
Frenética é a dor que o Globo sente.
Reflexos nós sentimos... tudo some...
Se quer somar, o resultado: a fome!
Mas é maior a fome do ambiente.
Douglas Alfonso
*CANCRO SOCIAL*
A fome é dor intensa, visceral,
Um cancro social, ruína d'alma;
É fruto do egoísmo que desalma
O espírito do ser que faz o mal.
É chaga latejante sem igual,
Que humilha o irmão e tira a sua calma;
Sentenciado o físico, se espalma,
Desmotivando a essência da moral.
E o pobre na dureza da aflição,
Contenta-se, com restos de um lixão...
E agradecido, segue a sua vida!
Porém, respiro fundo, a refletir:
Se não estamos a contribuir,
Potenciando o efeito genocida?
Aila Brito
*TENHO FOME…*
Tenho fome… de ver a mesa posta,
no lar de todo bom trabalhador.
Que o pão de cada dia, a seu dispor,
é merecido prêmio à mão disposta.
Tenho fome… de ver a sã proposta
da carta que nos traz, em seu teor,
direitos e deveres em vigor,
por vezes, violados, sem resposta…
Tenho fome… de ouvir soar, em coro,
a voz emudecida sem decoro —
a dor dos desvalidos me consome…
Tenho fome… de ter de volta a fome,
que faz pulsar o sonho, em meu solfejo…
Sem isso, vivo a morte — a fome almejo!
Elvira Drummond
*O DESESPERO DE UM PAI*
Desempregado, um pai, discretamente
Sofre calado um surto angustiante
Ao ver no filho a fome inconsequente
E, alucinado, foge vacilante.
A sua fuga, tosca e deprimente,
Não vence a fome, a faca mais cortante,
E nem bloqueia a luz da cruz presente
Que arrasa o filho ali, naquele instante.
A fome açoita e torna o triste lar
Numa mansão de horror e de desgraça
Mostrando ao pai a falsa solução...
Desesperado, o mesmo vai roubar
Numa avenida, rua ou numa praça
Para findar, com fome... na prisão...
Plácido Amaral
*O ESPECTRO DA FOME*
O tempo passa e a fome continua
matando, torturando feito guerra...
Miséria persistente em toda rua
e assim, em cada esquina, a vida encerra.
Sabemos da verdade nua e crua -
há nítidas riquezas nesta terra...
Mas a ganância eterna não recua,
não vê a dor, o grito de quem berra.
Toda cegueira tem que perecer,
há de reinar o amor no amanhecer...
Indago, qual seria a solução?
Oferecer a mão, doar o pão.
Findar o desperdício tão mortal,
apenas consumir o essencial!
Janete Sales Dany
*NATUREZA EM FÚRIA*
Reclamam incontáveis organismos
Que vivem no planeta formidável,
Outrora tendo sido tão saudável
Encontra-se à mercê dos cataclismos.
Mudanças radicais nos mecanismos
Que deram o equilíbrio sustentável
À Terra, de maneira irresponsável,
Dirigem nosso mundo para abismos.
A natureza irrompe furiosa,
Mostrando ser capaz, e poderosa,
De impor ao mundo o fim da humanidade...
Recuperando assim o paraíso
Que o homem perdeu por falta de juízo,
Envolto na ganância e na maldade.
José Rodrigues Filho
*A FOME PEDE PASSAGEM*
O pão que falta à mesa do mendigo
sacia a infinda fome das baratas,
dos ratos e cachorros vira-latas
fazendo dos lixões o seu abrigo.
Às vezes, encontramos pelo trigo
o joio de avarezas caricatas
que a podridão de tantas mãos ingratas
nos leva para o mais cruel jazigo
e lança para os corvos, com acinte,
o pão negado para o tal pedinte
que teve a sua vida desgraçada.
"Quem sabe, um dia, possa saciar
a fome de comida, afeto e lar",
reflete o maltrapilho na calçada.
Adilson Costa
*CÁRCERE*
— Por que me dói assim o assoviar,
Aqui, a enveredar a minha mente?
E nem dormir desfaz a dor latente.
Mamãe, por que me dói e rapta-me o ar?
— Filho, dormir engana a dor que sente,
Da fome a lhe fazer alucinar!
Indigna dor cruel; destrói o lar.
Ressono a corroer o ser carente!
— Mãezinha, acaba, agora, minha sina!
“Visão escureceu; passou o frio.
Travaram, dos olhares, a retina.”
— Filho meu, é o mundo que abandona!
“Findou assim o trágico e sombrio
Final, que a dor da fome aprisiona.”
Eufrasio Filho