TRILHA XLVIII - LÚGUBRE COM EPITÁFIO

*EPÍGRAFE*

Aqui jaz um poeta – a contragosto –

Último verso escrito, por Soares,

ainda em vida e... plena e, por suposto,

gozando de alegria com seus pares...

Mesmo que eu goste tanto dos pomares,

destes jardins florando em todo agosto;

deste arrebol bonito que o sol posto

deixa pintando as tardes sobre os mares...

Mesmo que em tudo eu veja vida e graça,

inexoravelmente o tempo passa,

e meus escritos, sei... Serão dispersos.

Por isso eu fiz meu verso derradeiro,

que alguém o entregue às mãos do irmão coveiro...

Que a lápide eternize um dos meus versos!

Edy Soares

*QUANDO EU MORRER...*

Quando eu morrer, amor, está aqui,

deixa sentir teu rosto no meu rosto.

Ouçamos juntos, mesmo o sol deposto,

o derradeiro e triste colibri...

Quando eu morrer, amor, então, sorri,

iluminando o breu que me é imposto

e deita o teu olhar no meu, com gosto,

enquanto o meu suspiro entrego a ti!

E mesmo em hora escura, lutuosa,

tu saberás que foste a bela rosa,

senhora deste amor pujante e forte!

Assim, atestarás na fria pedra:

“Descansa aqui o amor que sempre medra

e enflora dentre a dor, na vida e morte!”

Geisa Alves

*EPITÁFIO*

Quisera ser feliz, se lamentava!

Bem quis, na sua vida, merecer

Todo o desejo e glória do poder;

Orgias, bebedeiras... ostentava;

A boemia e a noite o despertava!

De nada lhe serviu o bel-prazer...

A farra, fez- lhe o corpo padecer;

E agora, a sua vida sepultava!

Na lápide, o queixume a se notar,

Dizia dessa vida de aventura;

Um epitáfio expresso, a lamentar -

"Aqui repousa a tola criatura,

Que não viveu, por não saber amar;

Padecerá na dor e na amargura"!

Aila Brito

*ÚLTIMO PEDIDO*

Por sendas caminhei, sofrendo tanto,

e bons sorrisos tive, com certeza!

Mas tudo já passou, a sutileza

deu vaga para as dores, para o pranto.

A morte sorrateira estende o manto,

segura sua foice com firmeza

e segue em sua busca (que tristeza!).

Meu corpo viverá no campo santo.

Por último pedido, peço, então,

que ponham esta frase no caixão:

"Do pó surgi e volto nesse instante".

E a lápide também terá a meta:

dizer que "Jaz, aqui, sutil poeta,

um sonhador e seu pensar vibrante".

Douglas Alfonso

*A FOICE DO SILÊNCIO*

O corvo perambula solitário

sem perceber que a brisa se apequena

e os vermes entram bem depressa em cena

cumprindo o que destina o calendário.

A foice do silêncio faz-se plena

cortando pouco a pouco o seu sudário

e a cruz que suportava em seu calvário

não diminui em nada a sua pena.

Nem mesmo resta a derradeira vela

e a rosa que foi posta na lapela

proclama com bastante nostalgia:

“A cova rasa alcança o firmamento

enquanto houver a fé no testamento

de quem sonhou ressuscitar um dia”.

Adilson Costa

*TRIUNFO PÓSTUMO*

Senti o seu chamado, em tom austero,

deixando-me sequer alternativa.

Aviso que jamais me desespero

(driblar o dissabor me torna ativa)!

Cedendo aos seus caprichos, o que quero

é ter, neste epitáfio, em cor bem viva,

a frase: “Fez da vida seu bolero,

dançando sempre audaz, persuasiva"…

Ó morte, nem você desfaz meu laço —

romper a fria lápide ameaço,

contando com sementes que plantei…

Em vida, arrematei um grande trunfo:

Amei, amei… por isso, aqui, triunfo —

naqueles que me amaram viverei!

Elvira Drummond

*PSICOGRAFIA*

... Pois nessa dimensão monocromática,

De forte realismo - estranho estágio -,

Confuso, pelo onírico apanágio,

Prossigo, vivo, em lógica automática!

A vívida pressão psicossomática

Refaz o meu destino e o velho adágio

Confirma-se, apesar de um mal presságio

Que ataca a minha consciência estática!

Eu sinto muito mais o sentimento

Que atua em todo interior, visível,

E explica o meu presente irreversível...

Mas, meu verdadeiríssimo argumento

Reside sobre a lápide, uma placa

Que diz: "Aqui a morte se destaca!"

Ricardo Camacho

*A MINHA HERANÇA*

Eu sei que todos morrem, não tem jeito,

Pois morre o pai, o avô e até o neto,

O pobre, o mal-amado e o mais dileto,

O rico, o malfeitor e o mais perfeito.

Eu sei que qualquer um está sujeito

A ter, sem esperar, o seu decreto

Que mude de repente o seu trajeto.

Eu sei que todos morrem, eu aceito.

Porém, como poeta, a todos peço:

Não ponham meus poemas no caixão,

Pois neles mora a vida que eu expresso.

Escrevam, por favor, no meu jazigo:

"Eu parto, mas meus versos ficarão

E espero que consigam bom abrigo!"

Luciano Dídimo

*TRISTES SENTIMENTOS*

Quero morrer repleto de lamentos

Numa melancolia amarga e plena,

Após comemorar com meus tormentos,

As testemunhas fúnebres da cena...

Não creio que esses tristes sentimentos

Reclamarão ao podre que me acena,

Ou se terão em versos, sofrimentos,

Porque poeta eu sou de luz pequena.

Desejo ter no túmulo a mensagem

Que diga como expus minha caída

Por ser somente um resto de paisagem.

Contendo no epitáfio, a despedida:

"Aquilo que escreveu foi só miragem,

De um mau poeta, estúpido e sem vida."

Plácido Amaral

*LÁPIDE DE UM POETA*

Ando no cemitério - o passo é lento -

mas a interrogação, jamais estia...

Piso na terra fofa, sem alento,

sinto que a morte é fria e tão sombria!

Sem medo, ostento um riso truculento -

a vida nunca foi o que queria...

Mas via sempre o azul no céu cinzento,

o que temer se a luz de Deus me guia?

No meu enterro, quero o trivial...

Na lápide, um sorriso colossal,

eterno e, logo abaixo, escrito assim:

"A vida de um poeta não tem fim...

Sei que, hoje, sou poema no infinito,

em cada verso meu, eu ressuscito!"

Janete Sales Dany

*LÁPIDE DE UM TROVADOR*

O tempo carcomeu minha postura,

A luz perdeu o brio e o céu o anil.

Sou parca gota d'água do cantil

– A vela que crepita por usura.

O vento sobre a campa traz a cura,

Ao derrubar a flâmula senil;

Sanando a sofrimento ao fim do ardil

Que é o trilhar da tênue vida dura.

“Femme fatale,” dá-me a boa morte,

Conserva meu poema e encerra a dor!

– Então escreva; disse-me a consorte:

“A poesia nunca desce à cova.

Neste final, perece um trovador,

Porém – eternizada – voa a trova."

Eufrasio Filho

*MEU CEMITÉRIO*

Brincava, sem temor, em meio às cruzes,

Carneiras, mausoléus ou catacumbas,

Fazendo de caixões minhas zabumbas,

Com velas refletindo tênues luzes.

Sem medo, desdenhei mortais capuzes;

Jamais senti pavor daquelas tumbas

Ou de encontrar zumbis, cruéis catumbas,

Ao tropeçar em falsas alcaçuzes.

As incontáveis noites, entre as almas,

Fizeram-me escutar o som das palmas

Por partilhar com elas meu viver.

O que me fez pensar para epitáfio:

"Aqui descansa um Bardo, não empáfio,

Que, dentre os mortos, canta o renascer".

José Rodrigues Filho

*MENSAGEIRO DAS QUIMERAS*

Aquela negridão que me seguia,

à espreita destes olhos sonhadores,

na curva terminal devora as cores

de toda dulçorosa fantasia.

Inábil, sinto o abraço, a névoa fria

da noite peçonhenta e meus clamores

não passam de inservíveis estertores

lançados da matéria fugidia.

O facho do horizonte que se apaga

agora testemunha a extinta saga

de um vate, mensageiro das quimeras.

Se os lábios revivessem um minuto,

fariam neste instante seu tributo:

"A voz de quem verseja excede as eras!"

Jerson Brito