LEMBRANÇAS DO PASSADO / DO FUTURO / DO PRESENTE

LEMBRANÇAS DO PASSADO I – 23 OUT 21

Edith Piaf, já com sessenta anos,

apaixonou-se por um homem nos seus trinta;

chegou aos poucos, sem que se pressinta,

sem um aviso quais os Grecorromanos;

não houve flecha a provocar afanos,

foi como um quadro a óleo que se pinta,

ou como esgrima de ardilosa finta,

um Gobelin dos mais variados panos.

O amor de Edith foi um rapaz grego,

a quem ela chamava de “Eu-te-amo”

ou “Sagapô”, na língua dos Helenos,

mas não parece ter sido só um amor cego,

nem provocado por motivo insano,

pois Sagapô não parecia amá-la menos...

LEMBRANÇAS DO PASSADO II

Claro falavam ser só um aproveitador,

querendo apenas seu dinheiro e posição;

contudo Edith, no seu coração,

não o pressentia como seu bajulador.

Costume antigo foi seu precursor:

os reis Micenianos tinham curta duração

e sofriam, após um ano, execução,

quando a Rainha desposava um sucessor.

Quando os Gregos na península chegaram,

implantaram seus costumes e seus deuses

e então os reis de fato governavam,

mas nas lendas sobre seus predecessores,

sem abanarem totalmente seus adeuses.

seu inconsciente coletivo dominavam.

LEMBRANÇAS DO PASSADO III

É bem possível que este belo amante

só desejasse realmente a sua rainha,

e a respeitasse em função do amor que tinha,

a demonstrar-lhe devoção firme e constante;

mas a cantora, mesmo em seu amor vibrante,

tinha consciência de sua idade, coitadinha!

Sagapô não regou com sangue a vinha,

mas finalmente se tornou periclitante

esse caso de amor sem mais desejo

e realmente, nao procurei qual o destino

que acabou acometendo este menino

de trinta anos, prendido nesse beijo.

Ficou Piaf, a cantora “pardalzinho”

de novo triste, seu coração aleijadinho.

LEMBRANÇAS DO FUTURO I – 24 JAN 2021

Por mais pareça ser um contrassenso,

é até comum termos lampejos do futuro,

que cedo ou tarde nos traz destino duro,

mesmo envolvido em seu arcano denso;

quando nos chega esse delírio tenso,

em geral é amortalhado no obscuro;

algumas vezes o seu contato é puro,

apenas vemos seda verde de seu lenço.

Mas é preciso recordar que a esperança

é o maior dos males, tão pesada,

que nem saiu da caixa de Pandora

e Epimeteu, ao ver essa esquivança,

sacudiu-a para fora, desolada

e por isso toda espera nos devora. (*)

(*) O titã Epimeteu convenceu Pandora a abrir a caixa.

LEMBRANÇAS DO FUTURO II

Que na verdade, é mais premonição

do que se encontra em nosso porvir;

certamente, se quisermos tudo ouvir,

nos livraremos de perigo em profusão;

quando o futuro nos reclama essa atenção

é para mal à nossa frente se fugir,

se recusarmos de sua voz o prevenir,

esse possível se converte em maldição.

Porque o futuro é sempre encruzilhada,

depende sempre da via que se toma,

quando um caminho nos traz felicidade,

enquanto o outro uma experiência desolada,

porém nenhuma vereda está em redoma,

é nossa a escolha por caprichos ou vaidade.

LEMBRANÇAS DO FUTURO III

A lembrança do futuro é discernível,

mais certamente como possibilidade;

se nos curvamos à impulsividade,

o resultado se torna irreversível;

infelizmente, a esperança é mais visivel

por um aviso de sua malignidade

e nos deixamos conduzir em inermidade

para essa sina maldita, mas possível.

Eu sempre tive dessas premonições

de “não vai por aí” e se obedeço,

realmente não conheço se fiz bem...

Somente sei que em umas tantas ocasiões,

para uma senda desolada eu desço,

por descurado haver de tal “porém”...

LEMBRANÇAS DO PRESENTE I – 25 OUT 21

Já muitas vezes declarei não creio

nesse “tempo” de passagem tão fugaz,

tapeçaria depositada em um assaz,

estrato após estrato com seu veio.

Nunca retomas o passado no teu seio,

nada dele de volta a gente traz

e nem sequer de recordar certo é capaz,

uma camada entra na outra de permeio.

Pois a lembrança é só a cor dessa memória

que se reflete de seu último lembrar,

todo o passado está morto e não retorna,

qual duas pessoas, com igual história,

não conseguem quadro idêntico pintar,

salvo como impressão confusa e morna.

LEMBRANÇAS DO PRESENTE II

Quanto ao futuro, é impossível se tocar:

ele está ali, mas é provável e fractal,

não se sabe se faz bem ou trará o mal

é imponderável e só existe ao se puxar,

pois é dotado de incerteza singular,

não se consegue encará-lo de frontal,

está de lado, não mais do que um portal

que logo gira e outro toma o seu lugar.

Já que o futuro só existe em tal momento

de ser tomada qualquer resolução,

ou que deixemos que por nós seja tomada;

poderá ser apenas brando ou um portento

dele atingir-te qual impertérrito vulcão,

mas até esse breve instante não é nada.

LEMBRANÇAS DO PRESENTE III

E se o passado já se foi e se o futuro

nao veio ainda, sendo ambos intangíveis,

só esses átimos do presente são visíveis,

mas como correm em direção ao obscuro!

O presente indo assentar-se no monturo

de mil presentes mortos, submersíveis,

nessas ondas do futuro intransponíveis,

mas que transpõem-te a alma como um furo

aberto em teu espelho do consciente,

ali a escorrer em movimento permanente,

sendo impossível um só momento conservar;

contudo só existe essa memória do presente,

já transformada ao se fazer subjacente,

quando outras vagas logo a fazem sossobrar...