TRILHA XLVI- SONETOS EM ENEASSÍLABOS - INFÂNCIA
*INFÂNCIA*
Em toda infância repousa o aroma
Adocicado, de eterna aurora...
Corre e bagunça, gargalha e chora...
Ó criancinha que não se doma!
Céu de alegria - razão em coma -
Na brincadeira infantil, sem hora,
O dia inteiro sem ver o "agora"
Pela inocência da azul redoma!
O belo dia se esvai, a mansa
Noite aconchega e, por fim, descansa
O anjinho fulvo com pés de lã...
Dormindo o sono de um deus-criança,
No sonho justo de própria herança,
Gozando a paz de eternal manhã!
Ricardo Camacho
*QUEM DERA!*
Penso e repenso num tempo antigo,
nos dias magos, candor de outrora:
a brincadeira na luz da aurora,
incauta vida, sem ver perigo!
Folguedos, jogos, troçar o amigo,
queimadas, piques na noite afora,
o gato Dom e a boneca Dora
- lembranças ternas guardei comigo!
Da meninice restou vontade,
um estribilho que nunca evade,
sonho infinito, lilás quimera...
Quem dera, assim, que possível fosse
retroceder ao decurso doce
e ser criança e brincar! Quem dera!
Geisa Alves
*SAUDOSA INFÂNCIA*
Dói-me a saudade da doce infância
Das alegrias (o dia inteiro),
Do pique-esconde, vivaz, matreiro
Da vida boa, da rica estância!
Dói-me a saudade... E no peito a instância
De ser feliz a alcançar ligeiro
O meu semblante infantil, certeiro;
Repleto em mim, de gentil fragrância!
Brincar de roda, contar histórias
Brincar de bola, somar vitórias...
Sempre um motivo , de sonho e paz!
Por isso trago a feliz lembrança,
Marcada em mim, do jardim criança!...
E quanta falta a inocência traz!
Aila Brito
*SE RODOPIO…*
Se rodopio no tempo atroz,
quem sabe encontro a fiel lembrança,
da fase doce, em que usava trança
vestindo rendas, crochés, filós…
Se rodopio, apesar que a sós,
vislumbro a nossa festiva dança,
harmonizando, no olhar-criança,
a cirandinha de todos nós…
Se rodopio, quem sabe vejo
nossa alegria, em gentil cortejo,
transfigurada em leal sorriso…
Se rodopio, em total desvio,
enlaço o tempo e retomo o fio
da doce infância, que então preciso!
Elvira Drummond
*INGÊNUA BELEZA*
– Menino ignóbil e tolo: grita.
Chorei enquanto dizia: – calma,
prefiro a infante inocência da alma
Ao ninho erguido em insânia; admita!
Um Sábio antigo e bondoso, cita:
“Aquele que ouve a criança, acalma
A vida e azeita, nas mãos, a palma;”
– Cantou assim com a voz bonita,
O eu refletido a sair do espelho,
E, examinando–me no imo diz:
– Escute agora um veraz conselho:
Na infância existe um luzir feliz.
De mãos seladas e em paz, ‘Fedelho,’
Pintemos juntos o céu de giz.
Eufrasio Filho
*RETRATOS DE UM INFANTE*
A minha pipa planava tonta
num céu que aos poucos perdeu a cor,
enquanto eu via, no faz de conta,
suspensa a nuvem chorar de dor.
Nem sempre a lua ficava pronta
depois de virmos o sol se pôr,
hoje a lembrança seu dedo aponta
para o inocente ladrão de flor.
Contava estrelas, sonhava tanto
que a noite um dia rasgou seu manto
fechando as portas do meu sorriso,
para mostrar que as lições da vida
não cicatrizam a atroz ferida
que o tempo faz sem qualquer aviso.
Adilson Costa
*A ESCURIDÃO NA INFÂNCIA*
A criancinha que havia em mim
Quando pensava em brinquedos raros,
Iniciava um projeto afim
Sem ter lazer, nos momentos claros.
A solidão, companheira enfim,
Não preferia carrinhos caros
Que até no escuro vivessem sim,
Na tenra infância em reais reparos.
Uma certeza de ver clarão
Por sermos ricos sem ter tostão,
Foi da pobreza, fiel irmã.
A escuridão, talismã feroz,
Que conseguiu contrafeito atroz,
Foi claridade e tornou-me fã.
Plácido Amaral
*DIAS DE PERALTA*
Reminiscências da infância leda
Adejam sobre a vivaz lembrança
Do tempo bom que vivi criança
Dormindo, sempre, em lençóis de seda.
Passava os dias gozando a treda
E abominável futura herança:
De carregar na barriga a pança
Que me atrapalha ao romper vereda.
Outubro, mês da criança, acende
Aquela luz pueril que prende
E cujo facho o traquinas tem...
Revisitando o passado, vivo!
Memórias fazem de mim cativo
Da faixa etária em que fui alguém.
José Rodrigues Filho
*MONÓLOGOS DA VIDA REAL*
Doces lembranças dos tempos idos,
da tenra idade, feliz, fugaz...
ali vivemos a plena paz,
dias felizes assim vividos.
O tempo passa, nos traz gemidos,
as amarguras, a dor voraz;
os bons momentos nos dizem jaz...
visto que somos dali banidos.
Entre soluços e choros temos
nossas histórias, as quais vivemos,
as marcas delas estão na tez.
No imaginário de cada ser,
muitos queriam poder viver
esses monólogos outra vez.
Douglas Alfonso
*TENRAS FLORES*
Um jardineiro saudoso enfeita
com os encantos do antigo tema
divagações, no feliz dilema
de atravessar a janela estreita.
Do sonhador a visão perfeita,
a galeria de graça extrema,
agora livre de toda algema,
tinge a alvorada que foi desfeita.
Aquela imagem de tenras flores
ainda nutre com suas cores
a envelhecida expressão do rosto.
Se os viridários da infância movem
as fantasias de um peito jovem,
jamais se perde o dulcífluo gosto.
Jerson Brito
*RETRATO DE INFÂNCIA*
Neste retrato, festejo a vida,
em outro, sinto o pesar latente.
Todo o passado atordoa a mente,
relembro a briga e a manhã perdida.
Prefiro o agora, pois há saída...
Eu aprendi a viver somente,
a olhar o dia que está presente —
o ontem esqueço, ao findar a lida.
Hoje, desenho o vivaz sorriso,
renascem flores, por onde piso,
e algumas vezes a vida dói!
Mas a criança persiste aqui...
Dentro do peito, jamais perdi —
venci o medo, virei herói!
Janete Sales Dany
*NO ALPENDRE*
Na tarde calma e feliz, parado,
Fico no alpendre sentado, olhando
A criançada a correr, brincando
Pelos terreiros por todo lado.
Contemplo a cena e relembro quando
Nos tempos idos do meu passado
Eu tanto havia acolá estado
A divertir-me – O poente brando
Vai coroando o final do dia...
Sempre que volto ao sertão amado,
Ao pensamento as lembranças vêm.
E rememoro a veraz magia,
A candidez, a pureza... o lado
Que tão somente as crianças têm.
Giliard Santos