TRILHA XLII- ÁLVARES DE AZEVEDO

*** SONETO ***

Passei ontem a noite junto dela.

Do camarote a divisão se erguia

apenas entre nós - e eu vivia

no doce alento dessa virgem bela...

Tanto amor, tanto fogo se revela

naqueles olhos negros! Só a via!

Música mais do céu, mais harmonia

aspirando nessa alma de donzela!

Como era doce aquele seio arfando!

Nos lábios que sorriso feiticeiro!

Daquelas horas lembro-me chorando!

Mas o que é triste e dói ao mundo inteiro

é sentir todo o seio palpitando...

Cheio de amores! E dormir solteiro!

Álvares de Azevedo

NÃO PODER TOCAR

A frustração que no teu seio existe

é o pesadelo de me ver sozinho,

não ter me entregue enfim, algum carinho,

que insinuasse que a libido insiste...

Por que descrer que o meu amor consiste

em te louvar te dando o meu caminho,

fazer-te amante no meu nobre ninho

e te provar que ser solteiro é triste?

Você me ouviu bater em sua porta

e sem deixar por ela eu vir passar,

desmoronou uma ilusão que, morta,

nem soube ver que ali devia entrar

um infeliz na dor que não suporta

olhar teu seio e não poder tocar...

Plácido Amaral

FRUSTRAÇÃO

Sob o luar, na noite que evapora

e não espera pelo meu queixume,

relembro, só, o instante que resume

a frustração sem par que sinto agora:

olhavas-me sem pejo e com demora,

e ao longe eu pressenti o teu perfume.

Brilhava em teu olhar um certo lume

que então pensei: eu, dele, sou senhora!

Imaginei momento pleno e ardente

e dei-te, num sorriso, todo o charme,

mas o destino pôs-se à nossa frente.

E eu sei que não existe o que o desarme,

pranteio, então, sozinha e tristemente,

sedenta do teu beijo a incendiar-me!

Geisa Alves

PAIXÃO REPENTE

O lindo olhar com muita graça veio

E um fogo-fátuo de paixão repente

Nasceu gerando, incontrolavelmente,

Imagens doces e de tudo alheio...

Percebe o colo arfante e o lindo seio

Numa evidência adulta e, mutuamente,

O gozo oculto, breve e incandescente

Raiou em meio ao camarote cheio...

Era uma tarde adormecida em cena,

Que logo deu a negridão repleta

A vez de acalentar a dor serena

No etéreo corpo da ilusão completa

Que se formou na jubilosa arena,

Presente na lembrança do poeta!

Ricardo Camacho

MEUS DEVANEIOS

O fogo ardente de um amor primeiro

Está queimando com ardor ferrenho

E, quando a vejo, pouco me contenho

Ao ver as curvas desse corpo inteiro.

Já reconheço seu suave cheiro,

O feromônio de maior empenho.

Se perguntares qual vontade tenho,

Direi assim, de modo verdadeiro:

- Eu sonho tê-la para mim sorrindo,

Tocar os lábios de desejos cheios;

Em sua face, seu semblante lindo.

Mas são somente puros devaneios,

Talvez o arroubo de algo tão infindo:

Dormir sentindo seus perfeitos seios.

Douglas Alfonso

UTOPIA

No camarote, a singular figura,

Com seu olhar noturno e o peito arfante,

Inebriava o meu olhar amante,

E me envolvia em sua formosura.

Eu desejei seus beijos com loucura,

E o riso farto, música sonante

A me embalar a vida, a todo instante;

E amar e amar... destarte, sem censura!.

Quanta doçura eu vi nos olhos seus;

Na boca rubra, a mais terna magia,

Enfeitiçando os sonhos que eram meus!

Mas tudo não passou de uma utopia,

Que resultou no doloroso adeus,

E o fim da minha efêmera alegria.

Aila Brito

MARIA

Feito nascente própria, a fonte de água esguia,

brilhando à luz que vem das frestas da janela

desliza lentamente, enfeita os seios dela

e escorre umedecendo as curvas de Maria.

Não há como querer, depois de vê-la um dia,

desver nem descrever a imagem nua e bela

no banho vespertino, um corpo de donzela…

Beleza igual, pensei que nunca existiria!

Invejo a densa espuma as gotas e o chuveiro,

até o espelho seu aguça o meu ciúme

por não ter sido quem tocou nem viu primeiro…

Que pena, finda o banho e resta o meu queixume.

Embalo o devaneio e vou dormir solteiro…

Sonhando com Maria, o que virou costume!

Edy Soares

LAMPEJO ARDENTE…

Estive perto dele, a noite inteira,

ouvindo, de Chopin, uma sonata —

intensa melodia que arrebata

e aviva o que passou, sem que se queira…

Pois rebobino o tempo à vez primeira —

no olhar parado, em pausa com fermata,

que aporta no sorriso que arremata

e traz de volta aquela quarta-feira…

E nessa bela noite triunfal,

ardente de paixão, que aqui exponho,

apago da lembrança todo mal…

Mas eis que se dissipa o bem risonho,

e visto o avesso triste, que afinal,

descubro que vivi um lindo sonho!

Elvira Drummond

LÁBIOS VIRGINAIS

Vi na plateia linda criatura,

Enquanto por garotas procurava,

Pudica e graciosa que sentava

À frente com a irmã na cobertura.

As luzes apagadas -sala escura-

Sentei ao lado dela e a mão ousava

Passar sobre as mãos dela que, deixava,

Tomando minha mão firmamos jura.

Durante sete meses, nas sessões,

Libidinagem mútua transcorria

Sem beijos, pois não houve condições

De apresentar o amor que me faria

Sofrer, entre as diversas frustrações,

A dor de não beijá-la nenhum dia.

José Rodrigues Filho

DELÍRIO FASCINANTE

Olhei, vibrei, pensei... eu quero agora!

Enlouqueci ao ver a poesia

no teu olhar que só me seduzia...

E a noite derramou a luz da aurora.

A tentação pulsou e, sem demora,

eu me senti escrava da magia,

que me ofertava o anelo que eu queria:

teu timbre em mim — a música sonora!

Uma atração sem fim domou o verso,

porém a vida expôs uma fronteira —

sonhei com a paixão que oferta o inverso...

O amor brincou comigo a noite inteira,

pois, na verdade, eu quis o controverso,

ao me entregar nos braços da cegueira...

Janete Sales Dany

A NOITE DE ONTEM

Ontem passei com ele a noite inteira

A alimentar meus sonhos cor de anil;

Seus gestos firmes, seu olhar viril...

Atingem-me de forma assaz certeira.

Meu coração em chamas, qual fogueira,

Logo alcançou o esplêndido barril

De pólvora em meu corpo juvenil...

Em sensação intensa e verdadeira.

E foi assim o nosso ardente enleio...

Aquele fogo-fátuo da paixão

Explicitou-se em meu arfante seio.

Mas sigo agora nesta vã ficção

Porque, de fato, o amante nunca veio

E a noite não foi mais do que ilusão.

Gilliard Santos