PRANTO AZUL
Pranto azul I – 5 jun 2021
Há muito escuto tua voz na madrugada;
Eu te encontro em meus sonhos e suplico,
Que o dia inteiro solitário em fico,
Que a vida sem te ver não vale nada...
E me sussurras, em jura compassada
Que chegará o dia e o sonho rico
Se escapará da noite e em vasto aplico
Reocupará esta minha vida imaginada.
Mas é preciso cumprir toda a sentença,
Antes que a alma tenha a liberdade
De pôr de lado este corpo transitório;
E fico à espera, nessa inútil crença
De me mesclar a ela em sua cidade,
Após quebrar a casca do envoltorio.
Pranto azul II
Nunca escutei um rouxinol cantar,
Somente ouvi a voz de minha amada,
Nem grave, nem aguda, moderada,
Na inflexão mais correta do falar.
Escuto algo em voz tão singular
Que me perfura a alma de alanceada,
Adaga em duplo gume de afiada,
Tal como um tango em fado a resvalar...
Ela me tange assim o corpo inteiro,
É um mar que me sossobra sem ajuda,
Que me afoga por dentro, voz cruel,
Que me arrepia todo, em derradeiro
Anel de rebeldia, que me escuda
Antes que atole completo em fel de mel.
Pranto azul III
Nem sei por que me vi assim prendido
Nessa armadilha de luz aveludada,
Em tais olhos castanhos mergulhada
Na ingenuidade experiente do sofrido.
De fato, o que me tenha seduzido
Talvez seja o desamor amarchetado
Que tenha por si mesma revelado,
No instante mesmo que a hei conhecido.
Olhos castanhos, levemente indiáticos,
Nem sei por que atraíram a mim, que
Sempre buscara mais o indoeuropeu,
Duas tochas de tristeza, sorumbáticos,
Olhos lascivos na pureza, em que
Me dissolvi, deixando de ser eu.