TRILHA XXXII - FAGUNDES VARELLA
*EU PASSAVA NA VIDA ERRANTE E VAGO*
Eu passava na vida errante e vago
Como o nauta perdido em noite escura,
Mas tu te ergueste peregrina e pura
Como o cisne inspirado em manso lago.
Beijava a onda num soluço mago
Das moles plumas a brilhante alvura.
E a voz ungida de eternal doçura
Roçava as nuvens em divino afago.
Vi-te, e nas chamas de fervor profundo
A teus pés afoguei a mocidade,
Esquecido de mim, de Deus, do mundo!
Mas, ai! Cedo fugiste!... da soidade,
Hoje te imploro desse amor tão fundo
Uma ideia, uma queixa, uma saudade!
Fagundes Varella
*PEREGRINO DO AMOR*
Aventurei-me a procurar, querida,
Por todo canto, o teu olhar brejeiro,
O requebrar, o riso feiticeiro,
A pele seda, tátil margarida...
Em cada rua, esquina ou avenida,
A prescrutar, sincero e interesseiro,
Peregrinava à noite e o dia inteiro,
Sem olvidar o trauma da partida!
Como uma estrela, em luminosidade
Riscando o céu, veloz, em desatino,
Deixou-me, na cruel escuridade.
E agora como um tolo peregrino,
Te busco, amor, no cerne da saudade -
Para aplacar a dor do meu destino!
Aila Brito
*LAPSO DE AMOR*
Sorvendo o pranto em finais dissabores,
E ao perceber o lilás da mudança,
Sem direção, combalido, se lança
Para o horizonte das íntimas cores!
Campos virentes de rosas e flores
Abrem morada real que se alcança,
Revigorando o donaire e a esperança
Que fertilizam os novos amores!
Eis um fenômeno, o vívido sonho
Rico de amor se desfez de repente
E o refrigério de um dia risonho
Tornou-se noite em saudade silente...
Ó peregrino do amor que, tristonho,
Chora o pretérito em filme na mente!
Ricardo Camacho
*SOMBRAS*
Imerso em mares de amor, ansiado,
e feito náufrago em busca insistente,
eu vislumbrei com blandícia luzente,
o belo olhar, a mirar-me em agrado!
Aventurei-me no porto impensado,
na intrepidez contumaz, loucamente...
No entanto, a falta se fez, de repente,
e encarcerou-me em martírio dobrado!
Naquelas águas, afoito, em desejo,
eu mergulhei em fugaz alegria,
que relembrando e sofrendo, versejo...
Sem entender o negrume do dia,
sem olvidar um olhar que revejo,
choro e macero a saudade sombria...
Geisa Alves
*A FAGUNDES VARELA*
Tu passaste na vida “errante e vago”,
E a vida vergastou tua alma pura,
Pois eu te sinto a dor e a desventura
Que, em ti, causaram um cruel estrago.
Da inspiração, era tão manso o lago,
Que refletia o Sol lá na altura.
Mas a perda, que a tudo transfigura,
Te embriagou do mais terrível trago...
Quando partiu, criança, deste mundo,
A “pomba predileta” da saudade,
Foi, com teu filho, o teu amor fecundo.
Depois, a esposa... a virginal metade...
E a dor te fez, de um modo mais profundo,
Um poeta sublime, de verdade!
Marcelo Henrique
*VISÃO MELANCÓLICA*
Em busca do passado que sorria,
contemplo a tua face e surge o grito:
–Amor, jamais me esqueça, eu necessito
das horas de aconchego e sintonia...
Imploro, quando sinto a nostalgia
do amor que foi perdido no infinito.
Aos poucos, verto a mágoa neste escrito
e crio o anoitecer na aurora fria.
Padeço, ao ver a alcova destruída —
lugar em que a impiedade da saudade
revela o que senti na despedida.
Neste fervor profundo que me invade,
sinto o fulgor no fôlego da vida...
Sou prisioneira desta castidade.
Janete Sales Dany
*INTERAÇÃO*
Entorpecido o cérebro procura
Tredas procelas, antes navegadas,
Em vastos oceanos revoltadas,
Que o homem do mar enfrenta com bravura.
Ignotos mares forjam a aventura
A esmo singrando... velas enfunadas!
Cortando a senda líquida de estradas
Que levam ao suplício da loucura.
O esquecimento, assim, priorizara,
Tentando não lembrar a amante rara
Que lhe traria, um dia, a plenitude
Livrando-o do terror das tempestades.
Ao vê-la, de relance, sem saudades,
Aos sete mares deu a finitude.
José Rodrigues Filho
*SOMBRAS DO PASSADO...*
O dia fez-se noite, enegrecido
com pensamento turvo, em tom nefasto.
Retorna, saltitante, no meu rasto,
um tempo que supunha ter vencido...
Chegando sem rumor ou alarido,
macula-me a ternura em que me abasto.
O algoz destila o mal intenso, vasto.
O sonho? Enlameado e corroído...
Pois temo o tal passado hostil, avaro,
que rasga o tempo e aponta-me uma cruz.
Pressinto o sacrifício, mas o encaro
lembrando do martírio de Jesus.
Se toda sombra guarda o lado claro,
verei, em seu avesso, a intensa luz!
Elvira Drummond
*DOMINADORA*
Apareceste em meu quarto, invasora,
Para tornar-me um escravo do amor...
Dominadora ao trazer esplendor,
Replandeceste uma fé condutora.
A residência sem luz refletora,
Ao receber-te tornou-me em fulgor
Que acalorado em paixão, em clamor,
Alforriavas sem ser redentora.
Mas ao deixares o lar, sobretudo,
Acalentaste a maldade soturna
Agonizante em feroz conteúdo.
E no aconchego da dor taciturna
Só herdarei todo afã carrancudo
Que prevalece em saudade noturna.
Plácido Amaral
*O NOSSO AMOR*
Amor, imenso amor inusitado,
Amor que, com o tempo, sempre aumenta,
Regado pela fé que nos sustenta,
Constrói o nosso lar abençoado.
Amor, constantemente destilado,
Em cada semelhança, sedimenta,
E, em cada diferença, complementa.
Amor, na fina prata, lapidado!
Envoltos na bandeira que fascina,
Amor que nos laçou na juventude,
Amor, imenso amor, que nos domina.
Buscamos, nesse amor, a plenitude,
Subindo de mãos dadas a colina
Até chegar a nossa finitude!
Luciano Dídimo
*AVENTUREIRO*
Conduzo sobre a tela alabastrina
afagos de um pincel embevecido
até disseminar o colorido
nas doces galerias da retina.
A imagem preparada desatina
o peito aventureiro, destemido
e enfrento imensidades desprovido
de senso, castidade e disciplina.
Embora pedregais experimente
enquanto perambulo nos cenários,
preciso ouvir o sonho persistente.
Querida, meus plangores solitários
embebem cobertores, simplesmente,
nos restos de infinitos viridários.
Jerson Brito
*TRAUMAS*
São fúteis as razões desse destino
na inabalável fé que outrora via,
um fio de esperança assaz tardia
no cerne tão cruel do desatino.
Tão fútil por demais e tão ladino
o brilho das estrelas quando o dia
tratou de renegar a galeria
de um céu de traje em gala vespertino.
Toda existência não será bastante
para sanar a dor que não suporta
a cicatriz profunda e tão marcante
que em vão tentei negar enquanto pude
ao contemplar a triste cria morta,
que abriu meus olhos para a negritude
Adilson Costa