Tal para cual
“Eu sofro tanto! Meus exaustos dias
Não sei por que logo ao nascer manchou-os
De negra profecia um Deus irado.
Outros meu fado invejam… Que loucura!
Que valem as ridículas vaidades
De uma vida opulenta, os falsos mimos
De gente que não ama? Até o gênio,
Que Deus lançou-me à doentia fronte
Qual semente perdida num rochedo –
Tudo isso que vale, se padeço!?”
(ÁLVARES DE AZEVEDO)
Deparei-me esta manhã com um vagabundo.
Sob o incandescente sol do meio-dia,
Com o calor se incomodar não parecia
E, na sarjeta, dormia um sono profundo.
Cheguei mais perto de seu corpo magro e imundo,
E constatei que o pobre-diabo sorria –
Talvez com uns trocados se esbaldaria
E nada mais lhe importava neste mundo.
Invejei-lhe a rústica felicidade –
Com ele trocaria, de muito bom grado,
Os fúteis caprichos repletos de vaidade
A mim concedidos por quem nunca há me amado…
E ainda há quem cobice, em meio à sociedade,
Meus lauréis de poeta e desditoso fado…!