O anel de sonetos
I - Imersos
A noite dos cabelos teus ainda
escorre pelos ombros da memória
na imagem ígnea, a doce luz notória,
de negro brilho quando a tarde finda.
À noite a boca tua é bem-vinda
nos beijos que nos contam a história
da chama que se faz rubra e sensória
nos lábios d' onde a mesma é provinda.
Lembrança, tu estás nela comigo.
No céu, na Terra, ou qualquer lugar,
seremos sempre o fogo do universo.
E mesmo se a distância, um castigo,
separa agora os corpos: há de amar!
No fundo da alma e mente estar imersos...
II - No céu
No fundo da alma e mente estar imersos
no espaço cúpido onde sou o amante,
no espaço terno e quente, ardor instante,
meandros onde as almas queimam versos.
Aonde vão os beijos no transverso
desejo ardente e oblíquo amor distante.
E onde os olhos teus dos meus diante
crepitam fogo expondo o nosso anverso:
a face anímica onde luz o amor;
o rosto da lisura e a chama fúlgida;
semblante claro como a luz do ser.
Distância, tempo e dor irá transpor
o néctar qu' há nas nossas rimas túrgidas,
qu' em nós presente vem o céu tecer...
III - Dos cabelos teus
... qu' em nós presente vem o céu tecer
de estrelas tanto quanto amor, querida!
Em meu jardim tu és manhã florida,
a minha tarde fresca e benquerer!
... qu' em nós preservem vivos o prazer
de ser o ocaso o encontro, e não partida,
de ser o acaso o conto mor que olvida
a dor passada e lembra o que há de ser.
Em sonho nos amamos [foi lembrança].
Enquanto a espera dói, também nos arde
o anseio urgente da paixão infinda.
O tempo sempre segue em frente e avança
o tom da cor do céu depois da tarde:
a noite dos cabelos teus ainda...
Trilogia: O anel de sonetos
I - Imersos
II - No céu
III - Dos cabelos teus