Beethoven, por Bilac

BEETHOVEN SURDO

Surdo, na universal indiferença, um dia,

Beethoven, levantando um desvairado apelo,

Sentiu a terra e o mar num mudo pesadelo...

E o seu mundo interior cantava e restrugia.

Torvo o gesto, perdido o olhar, hirto o cabelo,

Viu, sobre a orquestração que no seu crânio havia,

Os astros em torpor na imensidade fria,

O ar e os ventos sem voz, a natureza em gelo.

Era o nada, a eversão do caos no cataclismo,

A síncope do som no páramo profundo,

O silêncio, a algidez, o vácuo, o horror no abismo...

E Beethoven, no seu supremo desconforto,

Velho e pobre, caiu, como um deus moribundo,

Lançando a maldição sobre o universo morto!

Olavo Bilac
Enviado por Paulo Miranda em 02/10/2020
Código do texto: T7077386
Classificação de conteúdo: seguro