TRILHA DE SONETOS

AREIA MOVEDIÇA

Areia movediça que me engole

paixões, essências, ânsias, incertezas,

conflitos, credos, gritos e estranhezas,

esputa a mescla e impede que me evole...

Mistura o todo ao tudo que me acolhe...

Meus pensamentos nobres, de levezas...

Das crenças, esperanças e purezas,

sufoca dom qualquer que me console...

Eu me debato inteiro, endoidecido

no mar de grãos de areia fementido

e mais e mais me afundo em seu furor!

Ouvi, meu Pai, o filho que vos roga:

Salvai a minha vida que se afoga

na areia movediça do temor!

Marco Aurélio Vieira

VIDA MOVEDIÇA

A vida, meu poeta, é movediça,

- areia movediça traiçoeira -

e traz tanta emoção na sua esteira

que o medo de viver, por vezes, viça.

Mas temos que partir d’uma premissa:

a vida é boa e passa tão ligeira

que temos que vivê-la por inteira

sem medo, sem receios, sem preguiça.

A vida, meu amigo, é frágil rosa

tem seu perfume, mas também espinho

que sangra a terna mão que a acaricia.

Se a vida é movediça e caprichosa

vamos sorvê-la como o puro vinho

tragando-a devagar, com maestria.

Edir Pina de Barros

DE OLHOS ABERTOS

“Da areia movediça do temor”,

Dificilmente o ser humano escapa.

Seguro é ter da estrada exato mapa

Para evitar tamanho dissabor.

Urgente é se despir da rude capa,

Que cega um coração a todo amor.

Qualquer caminho ou direção que for,

Estrada fácil ou noutra atroz etapa.

Assim, de olhos abertos, consciente,

Bem firme, vai-se caminhar em frente,

Pisando em lama ou formação maciça.

Diminuindo a probabilidade

De se afundar, por infelicidade,

Na insidiosa areia movediça.

Fernando Belino

NUNCA SÓ

Dificilmente o ser humano escapa

Da senda que se mete, solitário,

Na terra, em breve, o trágico inventário

Perdendo o pergaminho, a sua capa!

Enquanto em pé, desenha sem borracha

O seu destino em verbo proletário,

Pisando com seus pés de locatário

Um solo cuja a mãe ele não acha!

Expende a lágrima no extremo instante

Quando esmorece e tudo está distante

Na treva oculta, mas, envolto a luz,

A luz amiga, sempre tão constante,

Que nunca trata como um filho errante

E apenas torna leve a sua cruz!

Ricardo Camacho

GRÃOS DE AREIA

Da areia movediça um grão germina

ao celebrar a vida a todo instante,

mesmo que a seiva esteja tão distante

das pálpebras abertas da matina.

Quando o vulcão desperto nos ensina

que a lava mesmo rubra e fumegante

também deixa o planeta mais brilhante

mudando a direção da sua sina.

Que as intempéries sejam nossa escada

de um ponto de partida da escalada

para a existência plena de bonanças

e as pedras que atravessam os caminhos

consigam transformar os torvelinhos

em fontes que só jorram águas mansas.

Adilson Costa

FORÇA E FÉ

Bem sei que a vida em si é um mar revolto

e, às vezes, somos barco à revelia,

singrando... Velas baixas, leme solto,

na espera de encontrar a calmaria.

Mas saiba, amigo, não é mago ou douto

quem diz que a vida é feita de alegria,

e, o homem que é feliz é sempre envolto

na luz dos seus momentos de magia.

As pedras lapidadas com tropeços

na certa servirão como adereços

ao vencedor das duras empreitadas.

Se vemos ao redor dunas maciças,

muros de pedra e areias movediças...

Com força e fé barreiras são quebradas!

Edy Soares

LAMA

A lama esbranquiçada o engole, vagarosa,

com fardos de paixões, anseios e conflitos

nos ombros com vergões de ardidos infinitos.

E sangra em meio à gosma, agora, cor-de-rosa...

Parece até que toda a natureza goza,

de boca aberta, o céu vomita seus atritos

e os animais, no cio, emitem roucos gritos,

ao vê-lo se envolver à lama pegajosa.

E se debate em vão, chorando endoidecido

no mar de barro edaz e vivo, em que é comido!

E mais e mais se atola em seu mortal furor!

Do nada, avista, a alcance, um galho pendurado

e o prende ao corpo, mas mantém-se em mesmo estado,

pois se afundou demais na lama do temor.

Marco Aurélio Vieira

PAZ MADURA

A paz que te ofereço é diferente

Daquela paz ingênua entressonhada,

Na vida mansa sem lutar, nem nada,

Que pensa alguém viver impunemente.

A paz que te ofereço é paz de gente

Crescida em crua luta, acostumada

A ter nos ombros carga bem pesada

E a se afundar na lama bravamente.

A paz que te ofereço tem dezenas

De manchas que lhe ofuscam a brancura

E traz algumas chamuscadas penas.

A paz que te ofereço é paz madura,

Forjada na justiça e amor apenas.

É paz sem medo, é paz somente, e pura...

Fernando Belino