ROSÁRIO

Pensava estar, altivo, em altos patamares

da humanidade, em vil contenda, vã disputa.

Apregoava, ao feito alheio, seus pilares

em teses tão chinfrins, delírios de conduta.

Achava mesmo andar nos veios estelares,

na austera solidão do que ninguém escuta,

com seus sonetos, mais perfeitos exemplares

já produzidos Terra adentro, verve arguta.

E prosseguia, só, roendo seus rigores,

sorvendo o próprio fel, veneno hemorroidário

de inveja e mágoa; fogo à pele, gelo em osso.

Olhar de empáfia, a rude esgar dos ditadores...

Até que um dia, atado ao cunho seu rosário,

mirou o céu, do chão saltou, caiu no fosso.

Marco Aurelio Vieira
Enviado por Marco Aurelio Vieira em 28/03/2020
Reeditado em 28/03/2020
Código do texto: T6899408
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