Sombra
Trépido o corpo, tal cortina leve
que o vento açoita toda noite fria,
no chão da casa a mesma sombra escreve
à luz do teto – muda companhia.
Mil novecentos e noventa, breve
e brutalmente, outro de mim recria.
Fugaz olhar, como olha o sol a neve
a transmutá-la noutra poesia.
Volto a ser um. Meu corpo acalma tarde.
Apago a luz, mas o clarão da rua
insiste entrar pela janela – um dó.
Vem-me trazer, acaso me acovarde,
símile estampa, para que eu possua
dom de fingir que não existo só.