AS QUATRO ESTAÇÕES - concerto para quarteto de cordas

AS QUATRO ESTAÇÕES - concerto para quarteto de cordas

PRIMAVERA - alegro

É primavera! Enfim sibipirunas

D'amarelo a cobrir todo o cimento...

O cinza dá lugar por um momento

À festa de andorinhas e graúnas.

Mil paixões, mesmo as mais inoportunas,

Vêm colorir o olhar de sentimento

Como se uma película de alento

Preenchesse nas retinas as lacunas!...

O tempo todo fico boquiaberto

A ver pelo arvoredo ora desperto

O sol dourar as copas nos outeiros.

Qualquer arbusto vão já s'embeleza

E em cada canto vê-se uma surpresa

Entre floradas, pássaros e cheiros...

* * *

VERÃO - vivace

O sol de meu grotão mais se aproxima

Por madurar as mangas do quintal.

No estio abria as nuvens afinal,

Radiando glorioso lá de cima!...

Mas chega o bem-te-vi com sua rima

E me olha de soslaio no juncal...

Dos baixios batuca o pica-pau

E algum japim gorjeia pouco acima.

É bom andar na roça após as chuvas

A ver logo brotar as águas claras,

Ou sabiás catando ao chão saúvas.

A fresca traz tucanos mais araras,

Que pousam sobre a prata d'embaúvas,

Enquanto o sol se põe entre taquaras...

* * *

OUTONO - adágio

O cheiro das goiabas pelo chão

S'espalha após a enchente derradeira.

Súbito, as folhas secas mais a poeira,

Redemoinham em forte viração...

Cai a tarde p'ros lados do sertão,

Corando terra e céu igual fogueira.

Entrementes, pousadas na figueira,

Maritacas chilreando n'um capão.

Tomado d'essa vã melancolia,

Que a Natura espalha indiferente,

Vou contemplando o fim de mais um dia.

E, inobstante pareça decadente,

O lusco-fusco calmo transluzia

Maturidade plena, finalmente...

* * *

INVERNO - andante

Pelos altos da serra neblinada,

Via-se um mar de morros verdejante,

Enquanto caminhava, mais adiante,

Vai-vem de curvas curtas pela estrada.

Nos longes trovejava outra geada

E o vento sibilava sempre uivante.

Eu paro para olhar meio ofegante

Em face da paisagem transtornada.

A tempestade chega, todavia.

Antes qu'eu alcançasse valhacouto,

Perseverava contra o céu revolto.

Logo forte torrente ali descia:

A terra n'um barreiro já s'esgaiva

E as nuvens vêm abaixo na saraiva!

Betim - 09 10 2019