VIDA DE CÃO
Num dia claro, em que me achei mais cãochorrento,
Lembrando-me do meu enfadonho passado,
Quis ver de vez o meu destino renegado
Sem que do “mundo-cão” me torne ciumento.
Vim duma reles raça a que chamam de rafeiro,
E ouvindo que eu próprio não sou carne nem peixe
Disse cá para mim: antes que alguém se queixe
Não é tarde nem cedo, vou-me já pôr no andeiro.
Esta vida de cão – no meio da rebanhada –
Sem ter direito sequer a qualquer gulodice
Tenho a impressão que não passa de rafeirice,
Portanto, é hoje o dia certo, do tudo ou nada!
Vida de cão, à sombra dum triste chaparro,
Sempre tratado a açorda e a assobiadelas,
Não, patrão camarada, trate você delas,
Porque, cá eu, não nasci para ser escarro!
Tenciono aproveitar boleia para Lisboa,
Pra aquela coisa a que chamam de “parlamento”
Ao menos terei certo um farto vencimento
E onde tenho quem por mim sua voz entoa!
Frassino Machado
In ODIRONIAS