Dois Sonetos muito Antigos
Que fez de mim esta vida maluca?
Quem sou eu? Que fez de mim o passado?
Sou como um machucado que machuca,
E vivo sempre, sempre machucado.
Que trago dentro desta minha cuca?
Por que me calo e vivo tão calado?
Quando penso caio numa arapuca
E me arrependo, então, de ter pensado.
Quando medito é que percebo o nada
Que há em tudo, e, com a alma assustada,
Pergunto ao mundo por que tudo é assim.
Mas, ao olhar tristemente o mundo além,
Percebo o nada que ele é também
E o grande nada que ele fez de mim.
II
Quando criança vesti a fantasia
Que me deram, fui palhaço assim,
E, palhaço, fiz o que não queria,
E a vida então fez o que quis de mim.
Dei gargalhadas cheias de agonia,
Derramei lágrimas sorrindo, enfim,
E a platéia aplaudiu quando devia,
E eu vi que o show jamais teria fim.
O tempo passou e não percebi.
Um dia subitamente cresci
E a fantasia não me coube mais.
E hoje, depois de tantos anos idos,
Foram-se os meus sorrisos fingidos,
Ficaram minhas lágrimas reais.