Soneto Desiludido
Não sei quem me vê nem sei se existo,
À sombra irreal de ser alguma coisa
Além da mera sombra de ser isto,
Onde a anulação de tudo repousa.
Não sei em que substância consisto,
Ave vaga que em campo ignoto pousa.
Não sei se sou um ou se sou um misto
De algo que pensa com algo que não ousa.
Sei que na fantasia inútil e linda,
Onde suponho meu ser só por supô-lo,
Enquanto o que sou dorme na berlinda,
Gozo a vida, esse inútil ouro de tolo,
Vendo tudo passar na hora finda,
como ave bêbada que cai ao solo.