TRIBUTO A AUGUSTO DOS ANJOS

"A própria força em que teu Ser se expande, para esconder-se nessa esfinge grande, deu-te (óh mistério que não se traduz!)". (Augusto dos Anjos)

TRIBUTO A AUGUSTO DOS ANJOS

Ele meu maior mestre: Augusto dos Anjos!

Ultrapassa as raias da âncora mesquinha

Porque é efêmera e sombria a tênue linha

Que separa a espécie humana dos arcanjos

Essa dinâmica que as eras derrota

E anula a formação química dos átomos

Tem no tempo reinventado por tomos

Federações autônomas de outras rotas

Para que eu consiga adentrar o portal

Dos renegados, escritores malditos -

Ao meu olhar puro - Poetas Benditos!

Sinto nele epifânica luz vital!

Resvalando em meus abismos mais profundos

Essa inspiração fúnebre de outros mundos.

(Edna Frigato)

--------------------------------------------------------------------------------------ANÁLISE LITERÁRIA DO SONETO ACIMA POR RENATO PASSOS DE BARROS

Belíssimo soneto hendecassílabo, Edna! Não sei se por intuição ou por opção, metrificou todos os versos em onze sílabas poéticas. Regularidade no ritmo, intertextualidade no jogo poético com Augusto dos Anjos. Entre os seus tantos diálogos hediondos com nosso mestre pré-modernista, essa retumbante e grandiosa homenagem iguala você à arte literária do homenageado. Ou quem sabe, nela, avança limites. Porque, na primeira estrofe, versa o eu-poético sobre ultrapassar "as raias da âncora mesquinha", usando como alicerce o discurso escatológico do "admirado". O que mais me impressiona, Feiticeira Dourada, é o seu poder e talento de rearranjar vocábulos inéditos no meio literário, acrescentando a eles novas roupagens linguísticas no encaixe contextual de seus textos. Daí que, nesses rearranjos, o poeta se iguala aos arcanjos.

No segundo quarteto, o eu-lírico retoma a ideia de transpor limites estéticos e poéticos quando afirma que "Essa dinâmica (...) tem (...) Federações autônomas=(independentes de seu mestre ou matriz) de outras rotas=(outros estilos poéticos)". Mas tal afirmação é feita, na voz frigatiana, de maneira hiperbólica - exageradamente épica: eras derrotadas; formação dos átomos anulada; tempo reinventado por tomos.

No primeiro terceto, a poetisa apresenta ao público leitor uma questão que pesou na carreira de Augusto: a falta de reconhecimento da Crítica Literária de sua época. Augusto dos Anjos era um renegado, um poeta maldito, como maldito também foi Rimbaud, Charles Bukowski, Tom Zé, Waly Salomão, Gregório de Matos, Zeca Baleiro, Edgar Alan Poe, Raul Seixas e tantos outros. No entanto, para o eu-lírico (e também para nós, fã do Clube Dos Anjos) , o poeta do Átomo e do Cosmo será sempre Bendito.

No último terceto, a poetisa define sua experiência literária com Dos Anjos como "epifânica luz vital" (perfeito!), contrastando antiteticamente com os vocábulos fúnebre e abismos.

As cismas existenciais do eu-lírico são esses abismos pessoais que se transformam em "epifânica luz vital".

Após atrevido convite feito pela dama, "essa epifânica luz vital" ilumina o baile poético de Augusto dos Anjos e Edna Frigato. Dessa dança, surgiu uma transgressora e impactante poesia digna de orgulhar o seu Mestre e apontar novos rumos para a talentosa discípula. Sabemos, nós leitores, que a poética frigatiana possui outros estilos, tanto no verso quanto na prosa, mas esse casamento com Augusto nos permitiu prazeroso mergulho à poesia que surpreende o leitor e o convida a ampliar seu horizonte de expectativas literárias. Obrigado por mais uma obra de arte, Edna Frigato! Beijos! E até mais ler!

(Renato Passos de Barros)