Retorno aos Sonetos de José Paes
 
Luiz Carlos Pais
 
Durante sua trajetória de vida literária, José Paes escreveu pequenos livros de poesia que tiveram circulação restrita em função das dificuldades desse setor cultural. Com 40 páginas, uma dessas publicações intitula-se Enlevos Versos e foi impressa na Castro Gráfica e Editora, de São Sebastião do Paraíso, Minas Gerais, em 1987. Essa publicação foi possível graças à colaboração da Academia Paraisense de Cultura, entidade da qual ele participou de sua fundação, na mesma época de lançamento do livro. A Exemplo das Águas, soneto abaixo reproduzido, foi publicado no referido livro. Trata-se de uma reflexão sobre o princípio da persistência dos ideais humanos para realizar os grandes sonhos ou mesmo posições políticas. No caso de José Paes, durante muitos anos, ele foi vinculado ao Partido Comunista do Brasil, cujo diretório municipal de São Sebastião do Paraíso foi criado em 1946, tendo ele sido escolhido como secretário desse núcleo. Como consequência foi detido duas vezes. A primeira, em 1951, no contexto de uma campanha mundial nacional em favor da Paz Mundial, bandeira erguida pelos comunistas daquela época. A segunda vez foi em 1964. Tinha ele firme convicção político quanto à necessidade de avançar o equilíbrio social do país, expandido às condições de acesso à educação e aos serviços sociais de modo geral. Eu escrevi sobre as experiências vivenciadas por ele nesse campo político e os resultados de minhas pesquisas estão no livro “História Recente de São Sebastião do Paraíso (1933 – 1964)”. O segundo soneto abaixo reproduzido é uma homenagem ao advogado e escritor paraisense Vaner Bícego, um dos beneméritos que auxiliou a fase a consolidação da Academia Paraisense de Cultura. O terceiro soneto, In Medium Virtus, expressa entendimento moral da época vivenciada pelo poeta no que diz respeito às vicissitudes que pessoas podem encontrar na vida.
 
 
Exemplo das Águas
 
José Paes
 
Nascem também as águas sobre os montes
E correm, a princípio, fragilmente,
Parece terem ideal ardente,
Juntam-se às procedentes de outras fontes.
 
Em rios se transformam e sob pontes
E entre florestas rompem bravamente.
E ao encontrarem algo resistente
Detendo-as, lhes tapando os horizontes,
 
Elas sobem, sutis e confiantes...
Depois, se atiram, formidáveis e ágeis,
E avançam para os mares, triunfantes,
 
Assim também, perfeitamente iguais
Às fartas águas, a princípio, frágeis,
São os mais justos e altos ideais!...
 
 
Homenagem a Vaner Bícego
 
José Paes
 
É mostrando o prazer que arde nas tuas veias
E a virtude que tens a dominar-se a fundo,
Que livros aos milhões pela vida semeias,
E nesse nobre afã como és também fecundo!
 
Enquanto espalhas tu bons livros a mancheias
Oferecendo vais rútilo bem profundo,
Já que as prendas que dás se encontram sempre cheias
De luzes perenais que iluminam o mundo...
 
Que esplêndido mister estás assim cumprindo
No campo do sabe, do áureo valor infindo,
Onde maior tesouro aos poucos se descerra!
 
De nossa Academia, em assembleia augusta,
Recebe, pois, irmão, esta homenagem justa,
Quando em visita estás à tua amada terra!
 
 
In Medium Virtus
 
José Paes
 
Fugindo à vida que oferece vidas
E faz que a flor milhões de flores traga;
Quantas..., nos ermos claustros escondidas,
Guardam no peito um coração que fraga!
 
Fugindo ao lar e suas nobres lidas
Cujas virtudes mão alguma apaga,
Quantas..., com messalina parecidas,
Fingem amor e disto exigem paga!
 
Umas, se julgam puras e divinas,
Outras se fazem novas messalinas.
Quanto contraste separá-las veio!
 
Mas ainda outras amam sendo honestas:
Esposas, mães, obreiras, fazem-se estas.
Aliás, “a virtude está no meio”!
 
 
Campo Grande, MS, 24 de Janeiro de 2016