CORTINA DE FUMAÇA

Insones nuvens zombam da fria madrugada...

Aonde traços da alvorada já rascunham um quase céu

Vãs estrelas semi-foscas no horizonte, em retaguarda,

Holofote à parca luz dum cinza que cai como véu.

Os lençóis amarfanhados são qual versos ao relento

Insistentes no propósito de um corpo aconchegar

Ao poema que então vaga, moribundo, em pensamento

Num projeto de existência quiçá por se consumar.

A primavera receosa- toda!- para num segundo,

Como se pusesse em luto seu dever de florear...

E um sabiá cantante faz silêncio absoluto

Para que então meu verso possa só resfolegar.

Cruza uma alva gaivota todo o cinza tão poluto

Na antítese da hora, aonde o dia vem raiar...