A NINFA - coroa de sonetos
A NINFA - sonetos geratriz
Fala para esquecer o amor e ser...
Ainda que o amor seja algo que exista,
Por difícil e raro, sempre dista
De quem ainda espera acontecer.
Se um sorriso é mais fácil de ter
Quando flertando vã em plena pista,
Para a noite outra roupa então se vista
No afã de mais e mor se parecer.
Porque o corpo desnudo bem revela
Uma verdade um pouco mais bonita,
Que a de quem nunca a nada se permita.
Ela fala e eu a escuto porque bela.
Como mentira muito bem contada,
Diz quase tudo, mas é quase nada.
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A NINFA - soneto primeiro
Fala para esquecer o amor e ser
Amante pelo instante vão d'um gozo.
Conta-me o quanto amar é perigoso
E nos meus braços quer só se aquecer.
Aconteceu d'eu vir-lhe a bel-prazer.
Conquanto fosse um pouco embaraçoso,
Pois, nem namorado e nem esposo
D'essa extremamente ávida mulher.
Porém, abandonada nada estranha.
Tem p'ra si que ciúmes e ilusões
Só têm entorpecido os corações.
Certa que em seu jogo ela é quem ganha,
Já parte para a próxima conquista,
Ainda que o amor seja algo que exista.
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A NINFA - soneto segundo
Ainda que o amor seja algo que exista,
N’algum vago recôndito da gente.
E não aquilo que ela, ardentemente,
Busca na noite só, fazendo pista...
Querendo desde a vã primeira vista
Se entregar sem que nada lhe acrescente,
Tem a exacta medida do que sente
De dor e prazer n’uma impressão mista.
Deitamo-nos cansados. Sós, enfim:
Estapeia minha cara de desejo
Enquanto me dá a outra face ao beijo.
Nada há para ela aqui. Nem para mim.
Não se aproxima mais, se amor à vista:
Por difícil e raro, sempre dista...
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A NINFA - soneto terceiro
Por difícil e raro, sempre dista
O luar nascente quando subo um monte:
Chegando ao topo, longe no horizonte
O que supunha perto e tinha em vista!
Ela -- como luar a olho nu – conquista.
Contudo, não importa onde desponte:
Uma hora me parece quase à fronte
E após se distancia algo intimista...
Bem amiúde a toco mais profundo...
Sinto-a desabrochar feito uma flor
E grata me agradar com mais ardor.
Ela tem medo, como todo mundo.
Afasta-se p’ra nunca se perder
De quem ainda espera acontecer.
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A NINFA - soneto quarto
De quem ainda espera acontecer,
Se escuta muitas vezes fantasias.
São relatos que aquecem noites frias
Dos que às escuras vêm se conhecer.
Assim vão re-encenando sem saber
Essa comédia de erros e agonias
A quem chamam de encontro... Onde apatias
São bem escaramuças do prazer.
E seguem partilhando vãos assuntos,
Porque dois solitários enfim juntos
Não são nunca o casal que fingem ser.
Sim outro paraíso artificial
Do sonho que pretende se ver real
Se um sorriso é mais fácil de ter.
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A NINFA - soneto quinto
Se um sorriso é mais fácil de ter
Enquanto se está de olhos bem fechados
Beijando loucamente homens errados
Ou explodindo de prazer outra mulher...
Como um fim em si mesmo, o seu prazer
A impele a seduzir desesperados:
Quem -- alheio a futuros e a passados --
Apenas o presente quer viver:
--“Afinal, de que serve ser bonita
Senão pela promessa sempre adiada
D'um pouco de prazer sem querer nada?”--
Outra bela mentira que acredita
Quem quiser... Se não há quem lhe resista
Quando flertando vã em plena pista…
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A NINFA - soneto sexto
Quando flertando vã em plena pista
-- Ainda mais bonita que já é...--
Seu olhar faiscante pode até
Derreter o mais frio narcisista.
Quem na arte de amar uma boa artista
Sabe se projetar ao olhar com fé
E desinibição... E bate o pé,
Marcando o território da conquista.
Despe-se totalmente enfeitiçante
Aos olhos que, experientes ou nem tanto,
Soubera cativar com seu encanto.
Mas partir sempre é mais interessante:
Para o dia, esse amante já despista;
Para a noite, outra roupa então se vista.
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A NINFA - soneto sétimo
--“Para a noite outra roupa então se vista
Tanto p'ra caçar quanto p'ra ser caça.
Pois dizem haver fogo se há fumaça
E paixão desde à vã primeira vista.”
“Portanto, na impressão do início invista
Aquela que quiser com sua graça
Despertar um desejo que perpassa
Toda a aura reluzindo sensualista.”
“Cuidado, porém: tudo é ilusório!
É preferível ir quando se pode;
Sempre antes que a rotina lhe incomode.”--
Não importa se dândi ou se finório...
A seu lado terá sempre um qualquer,
No afã de mais e mor se parecer.
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A NINFA - soneto oitavo
No afã de mais e mor se parecer,
Ela quer não o amor, mas sim amores:
--“Desejada a mulher cujos primores
Estejam na postura que ousa ter!”
“Nada -– diz ela -- vai acontecer
A quem espera príncipes, senhores,
Ou apenas homens um pouco melhores
Que aqueles que costuma conhecer.”
Concorde à sua vã filosofia,
Ela diz desconfiar de tudo e todos
E nunca se arriscar em vis engodos.
E a esplêndida nudez que oferecia
Tinha a verdade honesta de ser bela,
Porque o corpo desnudo bem revela...
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A NINFA - soneto nono
Porque o corpo desnudo bem revela
Exacto quanto d'alma mal se oculta.
Desconhecer-se é típico de estulta
Mentalidade em íntima procela...
Assim, quem o prazer à culpa atrela
Uma alheia alegria já lhe insulta.
Hipócrita, o culpado apôs se indulta
De faltas cometidas junto d'ela!...
E ria às gargalhadas dos coitados
Que a desejando a julgam n'um complexo
Onde se adora amor e se odeia sexo...
Murmura de amargura:--"Recalcados!
É bem mais fácil ter, se se acredita,
Uma verdade um pouco mais bonita".
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A NINFA - soneto décimo
Uma verdade um pouco mais bonita,
Que outras tantas verdades d'essa vida:
--“O indiferente rápido se olvida,
Mas se surpreende só um tolo evita!”
“Se apenas diversão, nada conflita.
Como se come a fruta oferecida...
Assim recebo e dou quando escolhida
Ou quando escolho quem me atrai e irrita.”
“Ser livre é não estar nunca obrigada!”
-- Eis a definição de liberdade
D’aquela que se quer em igualdade.--
--“Porque homens e mulheres não são nada
Além de humanos... Creio menor desdita,
Que a de quem nunca nada se permita.”
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A NINFA - soneto undécimo
Que a de quem nunca nada se permita
N'uma vida de dúvidas e esforços.
Prefere ela admirar peitos e dorsos
Nus, mas em posição muito esquisita...
Cansada de ver gente triste e aflita
De tanto acumular novos remorsos,
Busca esteticamente por estorços
Que em nua pele mais o olhar incita.
A beleza e o prazer que após promete
Mantêm na novidade um interesse
Que apenas com surpresas permanece.
E apontando-se, por fim reflete:
--"Esta zinha aqui não é pior que aquela!..."
Ela fala e eu a escuto, porque bela.
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A NINFA - soneto duodécimo
Ela fala e eu a escuto, porque bela
E é tão bom de escutar ela falando!...
Eu chego a devassar, de quando em quando,
O seu olhar que d'alma é qual janela.
Eu fico olhando para dentro d'ela
Enquanto, atento, vou lhe escutando.
Percebo-a contar n'um tom mais brando
Das coisas que n’alcova se revela.
Às vezes, seu olhar uma fagulha
Solta que me atravessa inteiramente
E me faz suspirar à sua frente.
Do que outrem se envergonha, ela se orgulha!
Pois vê a vida -- metade já de nada --
Como mentira muito bem contada.
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A NINFA - soneto tredécimo
Como mentira muito bem contada,
Lhe escuto o arrazoado e lhe pondero,
Que metade de nada não é zero;
Que, só e simplesmente, nada é nada!
Mas ela me argumenta:--"Conta errada!
A vida, por vazia, no exagero
Tem a única grandeza que enumero
Cuja metade fora computada".
"É a quota de prazer que nós todos
Nos permitimos quando o corpo pede
Seja isso cio, sono, fome ou sede".
"Por isso me saciei de muitos modos
A despeito do fado e até da estrada"--
Diz quase tudo, mas é quase nada...
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A NINFA - soneto quatridécimo
Diz quase tudo, mas é quase nada:
--"Isso de se saciar o corpo apenas
Não muda o facto que horas mais amenas" --
Digo-lhe -- "tem enquanto for saciada.
"Não demora muito e outra colherada...
E outro copo... e outra cama... e outras morenas...
Nossas necessidades são cadenas
Tão resistentes quanto uma forjada."
"Tenho buscado o amor sem saber onde...
E essa ânsia toda muito pouco visa
Sempre é mais livre quem menos precisa".
"Sexo 'inda é amor..." E ela me responde:
--"Amor? Já nem sei o que isso quer dizer!"
Fala para esquecer o amor e ser...
Contagem – 20 03 2014