SAUDADE
Essa saudade que sinto,
E não desejo sentir,
É feito beber vinho tinto
Fingindo não engolir.
É como olhar pro agora
Desejando ser depois,
Pois saudade é a demora
Na presença de nós dois.
Nunca sabe a expressão,
Desegana e põe loucura,
Como pode o coração
De saudade ter ventura?
Tudo nega do momento,
Ao futuro vira a cara,
A saudade é o testamento
Que ao passado se escancara.
E não pede permissão
Para ser o que se sente,
Esse ser do coração
Da saudade é delinquente.
Pulsa e grita murmurante
Nas paredes do destino,
A saudade é delirante
Feito o sonho do menino.
Crava a dúvida primeira
Entre todas de meu crivo,
A saudade é a maneira
De saber que eu estou vivo.
Tem o peso de uma pena
Repousada sobre o vento,
A saudade traz à cena
As personas do tormento.