A VELHA DA CANTAREIRA
“A Raúl Brandão,
Pensador do mar…”
Chegado pela tardinha do Alto-Nespereira,
Passou Raúl de humor um pouco angustiado
Naquele mar da Foz, bastante assoberbado,
Cujas ondas varriam toda a Cantareira.
Crestada pelo tempo, com gesto eriçado,
Indiferente à maré de inverno costumeira,
Olhou aquela velha que ia passageira
Vomitando impropérios contra o mar irado.
- Ai Tóino, Tóino, má raios partam o mar,
Ai home dum cabrão que foste no batel
Deixando-me sem pão e a saber a fel…
- Ai Tóino, Tóino – e a velha sempre a gritar –
Se este maldito mar com fúria te engoliu
Raios me levem esta sorte que me fugiu…
E o bom Raúl continuou meditabundo
Desfiando, um a um, os males deste mundo:
- Ai velha de uma cana, com filhos a rodos,
E aquele ingrato mar que os levou a todos!
Frassino Machado
In MUSA VIAJANTE