Terminal
Nunca pude com amor ensandecido,
e, agora, bem aos pés d'um desvario!...
Nego, fujo - dessa força me desvio
(quando eu voltar, ela já terá ido...)
Tenho engulhos de amor! É tão doído
ver uns tolos se afogando em tal rio!
(Se eu soubesse, nadaria... mas faz frio...)
(Se é para usar a ponte, até me agrido!)
Nunca pude com amor - eis a verdade.
Para mim não há mergulhos nem loucura...
Nunca pude com amor - não o mereço?
A resposta pressupõe serenidade:
se tristeza e descrença o amor cura,
eu concebo, neste fim, real começo.
(Considero explicar poesia coisa de bocó insensível, mas essa merece uma bússola: conversava com uma amiga, Bacharela em Enfermagem, sobre as crise de enxaqueca que me acometem - e há quanto tempo!; ela me explicou sobre o ciclo de reações pelo qual passam as pessoas com doença incurável, seja fatal ou de convivência. Então danei a divagar: e se amor/desamor fosse doença? O sofrimento de muitos é tão nítido; por vezes, se traduz fisicamente e (ao menos pelo que observo) segue ciclos, também... Como quase tudo o que conheço pode ser transformado para linguagem poética, aventurei-me a estruturar esse texto de forma que na primeira estrofe se expõem o CHOQUE e a NEGAÇÃO, as reações primárias constantes em literaturas médico-científicas. Em seguida- respeitando a ordem em que aparecem aos doentes 'de verdade' - vêm a RAIVA e a NEGOCIAÇÃO. O primeiro terceto fala da tristeza profunda - DEPRESSÃO, na verdade; o último fecha com a ACEITAÇÃO - necessidade presente em qualquer relação, inclusive com a doença, para que haja paz. Percebo que no poema isso parece outro tipo de negociação, mas o amor é meio assim, mesmo: interesseiro e persistente... Quanto à enxaqueca, vivo misturando as fases e intercalando-as com poesia. No entanto, minha reação em criar e/ou ler poemas não tem registro científico: a fase é pura ALEGRIA; espero seja a dos leitores, idem.)