Coveiro
Num dia, contemplando o Sol morrente,
Pus-me a enterrar meu cândido passado
Que tanto tinha já dilacerado,
Com mil lembranças ledas, minha mente.
Cavei profunda cova e, tão dolente,
Pus cada alegre dia já passado
Julgando sepultar, junto, meu fado
De ter, dentro do peito, dor demente.
Cada sonho, esperança e alegria
Enterrei nesta cova de amargura
No fundo de minh'alma turva e fria.
Mas ora, contemplando a campa escura,
Percebo que morri naquele dia
E cavei minha própria sepultura!