FORMOSO TEJO MEU de Francisco Rodrigues Lobo.

Trago este soneto de memória desde os meus tempos de jovem professor do ensino primário no Ribatejo.
Todos os anos, na época das chuvas, o Tejo saía do leito e inundava a imensa lezíria ribatejana. De Alpiarça, onde eu era mestre-escola, para Santarém (ida e volta), só de canoa a remos.
Era uma aventura!
Creio que o que me atraiu para o soneto de Rodrigues Lobo foi o saber que ele tinha morrido afogado no Tejo. O barco em que viajava para Lisboa, talvez na época das cheias, afundou-se e o Tejo que ele tanto amava ficou com ele para sempre.
Não tenho acesso a nenhuma cópia fiável do soneto, de maneira que é muito possível que o tenha reproduzido com algum erro. Que me perdoe o grande poeta pastoril da literatura pátria.

Francisco Rodrigues Lobo nasceu em 1580, o ano da morte de Camões e da morte da independência de Portugal.
Os reinos de Portugal e o de Castela “uniram-se” então sob a égide da família Habsburg, os Filipes. É claro que a união resultou, como não podia deixar de ser, em benefício do mais forte, a Espanha.
Durante sessenta anos, 1580-1640, Portugal foi-se gradualmente perdendo numa peninsularidade em que naturalmente dominavam a língua e a literatura castelhanas.
Uma parte da obra de Francisco Rodrigues Lobo foi escrita em castelhano. Mas foi ele que, talvez mais do que nenhum outro escritor luso daquela idade de trevas, manteve viva a chama da independência, com a sua criatividade literária e o seu amor á terra.
Uma boa parte da sua obra (especialmente Corte na Aldeia, o mais conhecido dos seus livros, e Condestabre, por ventura o mais desconhecido) pode ser considerada literatura de resistência.



Formoso Tejo meu, quão diferente
Te vejo e vi me vês agora e viste
Turvo te vejo eu, tu a mim triste
Claro te vi eu já, tu a mim contente.

A ti turvou-te o grosso da enchente
A que o teu largo campo não resiste
A mim mudou-me a vista em que consiste
Este meu ser contente ou descontente.

Já que fomos no mal participantes
Sejamo-lo no bem, oh quem me dera
Que fôssemos em tudo semelhantes

Mas logo vem a fresca primavera
Tu voltarás a ser o que eras dantes
Eu não sei se serei que dantes era.

Francisco Rodrigues Lobo