Pensamento Fugace
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Há dias, mui reles, que dá-me vontade
De sumir, de vez, com a trouxa às costas,
Esquartejar o meu passado em postas,
Sumir muito para além da cidade.
Por montes vaguear, sem luz, sem saudade,
Qual alpinista que galga encostas
Cegamente com fuças maldispostas,
Treze vezes, sem que nunca se enfade.
Há dias que busco o abrigo da placenta
Porque a vida, iníqua, me atormenta,
Ou, de perna aberta, a morte dá-se.
Mas, o que hoje penso, o que hoje sinto,
Amanhã, com juízo claro, distinto,
Direi que foi pensamento fugace.