O CORAÇÃO DO VELHO

O coração do velho é a mansidão do lago,

a angústia do passado, a lembrança do sonho.

Roído pelo tempo, é uma raiz, suponho,

exposta, ressequida, à procura de afago.

O amor que se lhe dê, pesa tanto em conforto,

que sendo uma migalha, é por milhões que vale.

Se quer vê-lo feliz, do futuro lhe fale,

se quer vê-lo sofrer, lembre o passado morto.

Consente em rir e é sol, tão só porque lhe apontem

a gota de ilusão que a velha angústia acalma,

chora o belo perdido, as mágoas que se contem.

O coração do velho é a sensitiva da alma,

que marca desolada e triste, o riso do ontem,

tem lembrança e não fé, já não espera a palma.

São Paulo, 11.04.90.