FACETAS XXVI & MAIS
FACETAS XXVI -- A CONSTANTE
Bondosa é essa mulher que enfrenta a vida
por toda sua existência e nunca pode
realmente vencer; e ainda acode
aos que estão ao redor, sem se sentir perdida,
porque percebe que, se a vida lhe fez mal,
foi ela quem deixou... e permitiu
aos outros dominá-la; e se iludiu
que poderia, em ser gentil, a esse fatal
destino de opressão mostrar firmeza.
Porque os outros nos podem controlar
e fazer o que querem, sem vergonha,
mas somos nós que os deixamos, por lerdeza,
e se soubermos, enfim, nos rebelar
só então se viverá quanto se sonha!...
O ERRE PERDIDO [para Neusa Tânia]
Se meu Erre for perdido, o que farei?
Reconquistar, Rastrear, Recuperar, Reter?
uma palavra mais não posso conceber
que me indique o caminho; já nem sei
para o que serve esse Erre doravante:
Rasgar, Roubar, Recalcitrar, Rugir?
pela falta de um Erre perquirir
onde ocultou-se esse sinal Rascante...
o Erre Risca o céu, como um coRisco,
Rapidamente Retira a propriedade,
transforma AMO em Ramo sem vaidade...
e, num Relance, percebo, com abalo:
o Erre não me Rasga, mas belisco
o céu da boca, a fim de pronunciá-lo...
FACETAS XXVII -- A CONSOLADORA
Bondosa é essa mulher, que enfrenta os medos,
para acalmar os outros, que mais temem;
ela é uma fonte de força e seus segredos
conserva para si... Mas eles tremem,
ainda mais, ao saber-se responsável
pelo andamento firme de seu lar,
com diligência enfrentado, na agradável
disposição que o pavor quer afastar...
É como se espargisse segurança
a quantos a rodeiam, doce fada,
ilusionista da dor, em perfeição,
para manter quem ama na bonança,
por mais que sofra sua alma atribulada,
pela mentira que traz no coração...
ONIROMANTE
Eu me acordei de um sonho, em que deitavas,
Sobre meu peito, as ondas dos cabelos;
Me acarinhavas, cheia de desvelos:
Mesmo ao ver que eu não queria, me beijavas.
E quantas vezes busquei que me abraçasses
E recusaste, por qualquer pretexto...
Mas sempre que fugi desse contexto,
Algo fazia com que retornasses...
Depois de tudo que tinha acontecido,
Não foi estranho que eu, um sonhador,
Por me ver desse modo entristecido,
Em conseqüência de teu querer despótico,
Por grande fosse a potência desse amor,
Me contentasse afinal, com um sonho erótico.
FACETAS XXVIII -- A ENFERMEIRA.
Bondosa é essa mulher que cura as dores
daqueles tantos que encontra sofredores,
no corpo e nalma, essa curandeira,
que lava e desinfeta o corpo e à beira
de um leito de doente paciente permanece,
que cuida e atende sempre e até esquece
de si mesma, na faina de altruísta.
dando o que pode, sem ânsia de conquista.
E todas são assim... até as perversas
sabem curar as almas quando querem,
sabem curar os corpos, se desejam;
e até os corações perdidos beijam,
quando tomadas por emoções diversas,
especialmente daqueles que mais ferem...
FACETAS XXIX – A GOVERNANTE
Bondosa é essa mulher que seu marido
deixa pensar que manda e que governa,
enquanto é ela que, mão firme e terna,
lhe sugere as ações, ao pé do ouvido...
sem enfrentar, nem maltratar o orgulho
de ser o ditador, que tudo pode;
que no seu lar, ao menos, se sacode
de humilhações externas e do esbulho
que sofre, enfim, sua masculinidade
no áspero lidar com adversários
e até mulheres que superiores são;
só em sua casa retoma a qualidade
de amo e senhor, nos gozos solitários
que ela finge lhe dar... por sedução.
FACETAS XXX – A LEITORA
Bondosa é essa mulher que, com paciência,
releu os meus sonetos ponta a ponta,
em busca do valor que lhes reponta
o significado e o poder de sua valência...
Porque bem sei que tem mais a fazer
do que ficar repassando meus caprichos,
a pretensão dos versos, destes lixos,
reaproveitados a meu bel-prazer...
Porque palavras vãs, soltas ao vento,
eu fui a reciclar... são borboletas,
libélulas, falenas... gafanhotos...
Lançadas na explosão dos perdigotos,
em frases feitas na glória do momento
destas trinta facetas ter completas...
JARDIM DO ESPANTO I - O HELIOTRÓPIO
Não me pertence o destino exuberante
de um cantor de rock ou de um piloto
glorificado; ou então de um boquirroto
político, nem sequer do altissonante
pastor ou padre de cunho carismático;
e nem sequer eu quero tais destinos.
A glória e a fama são dois desatinos,
cujo esplendor não passa de um errático
fluir efêmero de uma exaltação.
Minha vida é bem mais mansa e corriqueira:
somente em versos exalo minha paixão,
que vem de dentro e embala como o ópio.
E é bem assim minha vida alvissareira,
suave e humilde, tal como o heliotrópio.
METROS GREGOS I -
TROQUEU EM TRÂNSITO
Em nada a meu amor eu serei Dúbio:
Ao longo destes versos em que esPalho
A doçura da brisa e o martelar do Malho,
Em que comparo o ouro e o esplendor Núbio
De cabelos, ora crespos e onduLados,
Ora lisos e castanhos, brancas Águas,
Ora cacheados, recendendo a Mágoas,
Ora flutuantes de odores perfuMados,
Ou vermelhos ainda, eu permaNeço
Fiel a meu amor: eu só desCrevo
As sensações de meus momentos Sábios
De amores subitâneos, em que Cresço
Apenas no meu sonho; e aceito o enLevo,
Qual um beijo de amor sobre meus Lábios.
Um verso troqueu é aquele cujo pé poético [o final de cada verso] é formado por uma sílaba longa, seguida de uma sílaba curta. precisava transmitir esta informação?... Se não, desculpa... Bill.
VIVEIRO I -- O CISNE
A quem compararei o meu Amor?
Ao cisne alado, de grande envergadura,
Suas penas brancas, de singular textura,
Seu deslizar constante e sem temor...
Vive nos lagos, à sombra de um castelo
[Castelo eu tenho, no meu coração],
Corta as alturas, seus remígios são
Leme seguro ao seu destino belo...
E agora, ela se esforça por tornar
[Depois de tantos anos desperdidos],
Em perfeição, a mágoa de seu seio...
E sei que um dia chegarei a olhar
O vôo branco e os triunfos obtidos
De uma menina que foi Patinho Feio...
GOLPE DE PUA
e é só por pressentir as Agonias
de ver os outros ter o que eu não Tenho;
ao ver beijos de amor, não me Contenho,
em ânsia transitória e Nostalgias.
é uma dor passageira e Lancinante,
um desejo, afinal, sem Fundamento,
pois eu nem quero ter, não me Apresento
ao singular combate Expectante.
mas é que a mágoa chega, de Repente:
só num momento a dor é Cintilante,
depois escorre e pinga e já se Vai.
fica a memória apenas, Complacente,
do momento de inveja Acidulante,
que domina um instante e então se Esvai.
METROS GREGOS II --
ESPONDEU ESPONTÂNEO
Eu me sinto como quem não tem Mais Rei,
Tal quem perdeu a alma, poRém Fé
Conserva sempre; e à musa Fiel É.
Mantendo o juramento que Fez Lei.
Porém as emoções em mim Tão Nuas,
Sem cobertura, frágeis, não Têm Véu;
Meus velhos sentimentos vão Ao Léu
De tantas sensações que, enfim, São Tuas.
Amor se pede assim a quem Não Tem
Amor por dar e até mesmo Faz Crer
Que a ânsia desse amor nem seQuer Via.
E amor se perde fácil e aTé Sem
Motivos dar; é amor de quem Quer Ser
Aquele que te beija ao Meio-Dia!...
Preciso explicar que o verso espondeu deve terminar por duas sílabas longas, isto é, digamos, tônicas? como palavras com tônica e subtônica finais em português são raras, a solução é apelar para dois monossílabos ou para uma oxítona seguida de um monossílabo tônico. onde se prova que o espondeu não é muito espontâneo em nossa língua... até a próxima, bill.