SONETO PARA UM DOENTE TERMINAL
Queria que o sol me queimasse,
que a chuva me molhasse,
que um vento passasse
e que me curasse.
Queria que a dor que me invade
deixasse saudade
e que fosse embora
deixando-me agora.
O que d'antes outrora
em mim foi saúde,
e agora amiúde,
de pronto me leva rumo ataúde.
A dor da doença,
que nunca me vença.
minh'alma deseja
e a morte me beija
sem ter parecença.
E a tarde que cai
parece pior,
aumenta a saudade
de um tempo passado
quando a alegria
de longe me via
ficando ao meu lado!
A febre noturna
que vem semelhante
ao sol causticante
parece minar
a minha cabeça
pr'a que eu logo esqueça de
assim me curar.
A dor desta dor
que desejo eu,
dormir sem sentir,
amigo morfeu
não quero partir!
Oh vida! me abrace!
eterna menina,
retire a morfina
e mate esta dor.
Mas já vou partindo
vou quase sorrindo,
o mundo bendito
aqui vou deixando.
Nos braços de Deus
que enlaçam-se aos meus
descanço-me agora, tranquila
sem dores, sem ais.
E a morte sem sorte
que deixa-me agora
então vai embora,
já não me acha mais.