breve monólogo da morte...

nenhum ser vivo deveria temer a morte;
depois que nasce ninguém pode me evitar
de acompanhar a coisa viva sem parar
ditando o jogo pra quem brinca com a sorte...
sou como o verme que circula pelo sangue
correndo quente nos mamíferos roedores,
sou a lama negra que alimenta o podre mangue
que esconde o aroma do meu corpo em movimento...

dos seres vivos sou a certeza das suas dores
e o vil flagelo que liberta o sofrimento...
nenhum mortal conseguirá fugir de mim
estando vivo ele se liga ao meu destino
que fica nele desde moço (de menino)
como a certeza de que ele terá um fim...

seja mulher, seja valente ou até covarde,
eu sempre venço nessa luta sem sentido
que faz da vida um jogo eterno e repetido,
pois no final eu sempre ganho – cedo ou tarde...

por isso mesmo vou alertar a todo mundo
que faz de tudo pra evitar minha presença
- quem vive mais não se dar conta da sentença:
a cada dia seu sofrimento é mais profundo!
tudo que vive, vive apenas para a morte,
como a roleta que define a própria sorte!
algum poeta vai tentar me convencer
de que a existência permanece na poesia
eternizada na palavra noite e dia
como se a vida fosse vida sem sofrer...

eu sou mais forte do que toda fantasia,
diante do tempo eu limito o bom prazer
e vez por outra faço o homem perceber
que a sua desgraça não desperta simpatia...
ninguém conhece desta vida o seu sentido
antes que tenha desvendado o meu segredo
e todo artista me parece convencido
de que a sua arte manterá sua existência...
doce ilusão disseminada com freqüência,
pois nada disso livra o homem do meu medo...

ai que me dera conservar como o cimento
a vida humana tão repleta de miséria
que faz do tempo um valor ou coisa séria
sem se dar conta do seu eterno sofrimento...