Soneto da Mortificação
Quando o coração for, enfim, só seu,
Ele haverá de amar mulheres mil
E nestas muitas aspergir, febril,
O amor que a apenas uma concedeu.
Há-de pedir de volta o que escreveu,
Da arrebatada carta ao verso mais pueril.
Expulsará de si este seu eu servil;
Será Otelo, já não mais Romeu
E quando, por remorsos ou piedade,
Ela, a ingrata, pôr-se a o procurar,
Encontrará só as flores da saudade
Que, no jardim que ela não quis regar,
Hão de brotar a cada fim de tarde
Como um cilício velho a lhe mortificar.