As Meninas

Entre as meninas, um hiato ditado pelo destino. Uma, menina-moça, inquieta-se diante da mulher que busca desabrochar de dentro de si. A outra, menina-mulher, desabrochada sem arbítrio, recolhe-se em seu pequeno mundo para esquecer-se da dura sina.

Entre ambas, somente a essência intacta, guardada num bauzinho. Ficaram para trás os laços de fita, os sapatinhos de fivela, as bonecas, as caretas, as soquetes, as calcinhas bordadas... Ficou a meninice.

Despertar

Ainda és menina e teu fruto verde-claro

Repousa sereno na zelosa folhagem

Que o sono inocente acalenta feito pajem

Neste cenário encantado com que deparo.

Caminho desejoso seguindo meu faro

E me lanço de arroubo tomando coragem,

Que só existe porque os sentidos reagem,

Mas ofereço mais em momento tão raro.

Se me devotas tão crédula teu apreço

Na sublime despedida da castidade,

Honra que me atordoa ao cismar se mereço,

Prometo de tudo fazer como te agrade,

Desde beijos e carícias com que te aqueço

Até devassar-te de todo a intimidade.

Zona de Refúgio

És um sensível botão em veludo

E quase impossível que se descubra,

Não fosse essa música e luz tão rubra,

Que no teu ventre há um pouco de tudo.

O moço se gaba rijo e sisudo,

O velho ora é moço se te vislumbra

Fagueira, flutuando na penumbra,

De corpo bem-feito, o seio miúdo.

Se todos soubessem de teu encanto,

Teus predicados de mulher ardente,

Que em razão de outrem sufoca o pranto,

Tornando o mortal um deus de repente.

Mas, a sós, te pões a chorar num canto,

Pois inda és menina e também carente.

Éder de Araújo
Enviado por Éder de Araújo em 15/04/2006
Reeditado em 13/05/2017
Código do texto: T139515
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