Corpo de poeta
Ao dissecar os tomos da anatomia
e esquartejar a carne exangue do poeta,
fiz-me entrar, por sua artéria mais secreta,
nos pensamentos dúbios da dicotomia.
Ao auscultar-lhe o coração que não batia,
ainda pude ouvir-lhe um sopro de tristeza,
a sussurar-me, segredar-me a incerteza
de que morrera pra dar vida à poesia.
Tolo poeta! Viveu mais do que devia.
Viveu nos sonhos da profana fantasia,
que a morte faz mudar o eterno endereço.
Viveu acalentando sua eutimia,
a espera da certeza de chegar o dia
em que no seu jazigo ornará seu berço.