PERDIDO
Sinto-me, sem sentir, todo abrasado,
No rigoroso fogo que me alenta;
O mal que me consome me sustenta,
O bem que me entretém, me dá cuidado.
Ando sem me mover, falo calado,
O que mais perto vejo se me ausenta,
E o que estou sem ver, mais me atormenta;
Alegro-me de ver-me atormentado.
Choro no mesmo ponto em que me rio,
Maior risco me anima a confiança,
Do que menos se espera estou mais certo.
Mas, se de confiado desconfio,
É porque entre os receios da mudança,
Ando perdido em mim, como em deserto.
(Do Cordel POEMAS DE UM HOMEM SÓ)