SOBRE O MUSICAL "O JOVEM FRANKENSTEIN"

Acredito que aqui tenha chegado atrasada para falar dum espetáculo musical de teatro que muito me impressionou, posto que sua última exibição será no próximo final de semana, em Sampa.

Antes de falar da peça em si, gostaria de falar que me encantei com o enredo do palco que, na verdade, se trata duma espécie de "crossover", ou uma continuação do clássico livro de Mary Shelley , drama de ficção científica, com características de HORROR GÓTICO, publicado em 1818, no qual um médico, tido como meio louco ,o VICTOR FRANKENSTEIN, resolve criar um novo SER HUMANO no seu laboratório, na tentativa de "fazer um mundo melhor". Só que...

Victor tinha, de fato, uma boa intenção, a DE MELHORAR O MUNDO, algo que não aconteceu até hoje; e aí se resume todo o mérito do enredo do livro ORIGINAL, uma profunda discussão PSICANALÍTICA, que engloba toda a tábua de valores humanos e humanísticos, desde a ética, a ambição pelo conhecimento, a sustentabilidade ambiental, a busca constante pela felicidade, o enfrentamento da solidão humana, a discussão da gênese possível da injustiça social e principalmente A ASSUMPÇÃO SOBRE AS CONSEQUÊNCIAS DOS NOSSOS ATOS...que podem desandar nossas vidas para sempre.

A obra prima é duma profundidade filosófica abissal. Difícil fazer humor derivado dela.

Por que narro esse prólogo?

Porque as obras derivadas, tanto o filme de Mel Brooks, passando pela peça da Broadway , a chegar ao musical brasileiro, são obras derivadas da HISTÓRIA ORIGINAL.

Na verdade, só quem leu o livro da Mary Shelley percebe as sutilezas das mensagens jogadas no palco; algo lindamente sugerido por Mel Brooks; e eu só descobri que o novo enredo era dele depois de pesquisar sobre.

Sobre a nossa performance no retrato do musical:

ADOREI. Muito artístico!

Embora bem humorada a peça musical está bem longe de ser... HUMOR.

É reflexão profunda ao som da arte...

Senti que o enredo reencenado foi muito bem articulado porque se tenta. a meu ver, "consertar" o erro médico do VICTOR FRANKEISTEIN que construiu uma criatura ,chamada "The Monster", que tanto sofreu pelos caminhos do mundo...até desaparecer na escuridão congelada do Polo Norte.

A batalha, no livro, se trava entre CRIATURA E CRIADOR e agora, no teatro , o NETO DE VICTOR , médico e cientista, a despeito de encontrar a receita do avô no castelo da Transilvânia e também errar nas etapas da construção dum novo "The Monster", desfecha um destino em antítese, de outra "vida emocional" à nova criatura de laboratório.

Parece até uma vingança, um "acerto de contas" pelo tempo, do falho experimento científico de Victor , já que no teatro alguns personagens da história clássica são reavivados, inclusive com os seus nomes originais, mas em novos destinos.

O espetáculo musical "em si" é maravilhoso, principalmente a dança de sapateado, à minha percepção, o ponto alto do palco.

Ali, somos remetidos aos clássicos e inesquecíveis musicais de Hollywood.

Ressalto como ponto fraco algumas piadinhas meio clichê, meio sem graça. A mim, humor ruim incomoda.

De fato, é bem mais fácil construir diálogos em drama do que fazer um humor que encante...sem se ser banal ou apelativo.

Observação: e eu que saí dali encantada com o enredo baseado no livro original que li, acreditando que a ideia de reengendrar o enredo da peça tinha sido do nosso dramaturgia brasileira.

Minha conclusão sobre a mensagem DE RAÍZ ( e das demais) de VICTOR FRANKENSTEIN: sim, somos todos responsáveis pelas "nossas criações" em todos os campos das nossas vidas.

Os experimentos perigosos dos nossos "livros" podem não dar certo...mas sempre podemos tentar melhorá-los no cinema e nos teatros da vida (ensina, PORTANTO, a versão derivada e considerada genial, a de Mel Brooks, 1974)

Como sugere Mary Shelley no final do seu triste livro, tão lindamente otimizado de Esperança nas demais versões artísticas: pelos nossos mares, às vezes , podemos embarcar e desaparecer na escuridão gelada do Polo Norte.

Noutras derivações temáticas, no entanto, podemos dançar alegremente , a sapatear pelos caminhos, contornando as adversidades.

Os espetáculos dos "nossos palcos" estão longe de ser só drama ou só humor...

Sorte, destino, ou mera obra das nossas mãos?