"CASAMENTO MATUTO PARA QUADRILHAS DE FESTAS JUNINAS (3)" Texto de: Flávio Cavalcante

3º Casamento Matuto do ano de 1992

Arraiá “Oi eu aqui de novo”

Texto de:

Flávio Cavalcante

Direção: Vicente da quadrilha

Roll dos personagens

NOIVO - José Minervino Rêgo Perto

NOIVA – Guilhermina Piriquito Justo

PADRE – Zé Tacucunacara

IRMÃ DA NOIVA – Juventina dos Rego Aberto

FLEIRA – Mariquita pé de bolo

Apresentação e Sinopse

Esse casamento vai dar o que falar. Imagine uma confusão dentro da igreja por causa de um homem que queria ensinar a sua noiva a enterrar macaxeira, quando foi flagrada pela irmã da noiva, mulher valente e disposta a tudo. Como é... Casa ou não casa?

Todos entram na quadrilha na maior confusão, menos a mãe da noiva e o noivo. Uns discutindo com os outros. De repente a Juventina entra em cena empurrando o noivo “Chico Minervino”

JUVENTINA

(Empurrando o Chico). Vem cá caba da peste! Tu tá pensano qui minha rimã é manteguêro de hoté qui tu passa a mão e fica pro isso mermo, é? Tu pensa que eu num vi não, foi? E tu ia botano essa língua de jacaré onde?

PADRE

Quer que eu diga, minha filha? E quem não sabe que foi na... (É atrapalhado pela freira, que fica escandalizada com a reação do padre).

FREIRA

(Aos berros). Padre Zé Tacucunacara, home tu me respeita, que em toda minha vida eu só conheci um homem que foi o meu pai...

PADRE

E o teu primo Juca, que falaste até o tamanho...

FREIRA

Oxente... Então foi dois...

PADRE

Comigo já vai três... Não te lembras mais, mulher de Deus? A gente quando era criança, brincava de pular a moita do partido de cana...

FREIRA

É padre! Recordar da saudade... Então os homens que eu conheci, já perdi até as contas...

JUVENTINA

Tu é quenga mermo, mulé... E pior é que tua mãe num sabe...

FREIRA

(Grita histericamente). Aiii! Padre! Essa mulherzinha tá me desmoralizando! Eu sou Mariquita pé de bolo! Nem sou quenga e nem sou bolacheira... Moro no bairro das bêra

raspadas, onde home é home e mulé é mulé... Quenga não...

GUILHERMINA

Pela cara... Isso dá mais do que Chuchu na serra... (Transição). Baixa teu facho, pro qui besta no cio dá o qui falar...

CHICO

(Querendo se sair). Oxente! Me alembrei duma coisa... E num é qui eu deixei meu jegue sorto na horta? Vai cumê meu milho todinho... Vou lá ver... (Faz menção que vai sair, mas é impedido pela Juventina).

JUVENTINA

(Puxando bruscamente). Vem pra cá, besta fubana... Tu quando cumeu minha rimã tu num tava procupado cum teu milho... Tu tá ficano besta... Tu vai casar pra nunca mais mexer cum as sobrinhas dos outro... Fi da peste!

PADRE

É triste mesmo!

GUILHERMINA

É triste nada, padre! A minha tia ouviu a banda tocar e num sabe aonde... A estória num foi bem assim cuma ela tá dizeno não, visse? Repare bem! Arepare bem mermo, proque eu num vou conta a merma estória duas vez, que eu num cá peste no coro e num tou doida! Meu tio, Florisbundo, que é macho da minha tia Juventina, comprou um casuá de macaxeira pra eu enterrar... Mas eu nunca mexeriquei cum essas coisa... Aí, chamei o Chico pra me ensinar a eu enterrar a macaxeira... E aí, ele enterrou dum jeito deferente, com uma macaxeira qui nunca vi mais gorda na minha vida... E num é que eu gostei? Home, padre! Se enterrar macaxeira é tão bom daquele jeito, eu nunca mais vou deixar de enterrar...

PADRE

(Se benze). Credo em cruz...

FREIRA

(Curiosa). E é tão bom assim, é?

GUILHERMINA

É... E apois...

FREIRA

Assim do jeito que tu tá falando?

GUILHERMINA

Assim mermo... Do jeito que eu tou falano...

FREIRA

(Falando com Chico). E tu me ensina, meu filho?

CHICO

Só com uma condição...

FREIRA

É só pedir que eu arreganho...

PADRE

(Repreende). E que pouca vergonha é esta dentro da minha igreja? Eu não estou entendendo mais nada! O que é que tu vais arreganhar, irmã?

FREIRA

... Mas também o senhor é malicioso, padre! Eu, hein? Eu tou querendo dizer que eu arreganho as idéias... Entendeu agora?

PADRE

(Olhando para o céu). Senhor tem de piedade de mim...

CHICO

Rogai por mim, padre... Eu num quero casar cum essa mulesta aí...

JUVENTINA

(De salto). Num quer o que, doença braba? Tu é besta de fazer uma coisa dessa! Vai tinhoso... Tira onde cum a minha cara aqui, pra tu ver se tu vai vortar cum argum dente dessa boca pôde!

PADRE

E porquê não queres casar com a feiosa? Não achou bonzinho de ensinar a ela a enterrar macaxeira?

JVENTINA

Mas padre Tacucunacara... Oi, que me dar um ódio quano lembro duma presepada dessa! Sei não, visse? Sei não...

CHICO

(Com a Juventina). Sei não o que?

PADRE

Sei não? Perante Deus e os homens... Você vai casar, sim... Irmã... Traga pra cá a noiva e o professor de macaxeira...

JUVENTINA

(De salto). Deixe cum eu, fuleira, que quem vai pegar esse cachorro guenzo da peste serena é eu... (Pega o Chico pela beca). Oia aqui pade... Na minha mão, home num é home não... Mas mulé... É mulé virada na gota estopô!

GUILHERMINA

E quer saber duma coisa? Se vai começar logo essa foleragem, que cumece logo, que eu já tou pensando em chamar na colé cum as macaxeira de novo...

PADRE

Eu já jurei por tudo que é mais sagrado nesse mundo, que eu não ia mais fazer um casamento problemático desse jeito... Mas já pude crer que quem cospe pra cima, acaba caindo na cara mesmo!

FREIRA

Quanto mais se abaixa é que o feio aparece! Bem empregado pro senhor...

CHICO

Tô calado!

PADRE

Vocês estão vendo meus fieis? Como eu posso ser um sacerdote normal e me parece uma noiva que enterra macaxeira por que gosta da profissão? Tem que é pedra ruim! Mais grossa que as parede de nossa igreja! E mais estúpida do que uma vaca pastando... (Transição bate com a mão na testa como quem lembrou de alguma coisa). Mas por falar em vaca... Eu já ia esquecendo... Oh, irmã... Tu nem levaste o boi de teu pai, pra cobrir com a vaca da minha mãe, que já tá ficando maninha de tanto tá no cio... Mas deixa pra lá... Mas não esquece de levar o boi de teu lá em casa, tá bom? (Transição). Mas por falar em vaca... (Com a noiva). Tem certeza que quer casar com esse boi?

GUILHERMINA

... Mas pade... Eu num mereço isso não... Um boi é muito coisa... Eu num seio nem cuma fazer... E boi é animá... Macaxeira é vagetá e eu prefiro um vegeta bem grosso...

PADRE

(Decepcionado). Que história mais feia de... Vegetá?

GUILHERMINA

Macaxeira, oxente!

PADRE

Mas tu só pensas naquilo? Mas tu só pensas besteira, dona Guilhermina...

GUILHERMINA

O senhor só fala assim, pro qui nunca exprementou da macaxeira de Chico...

CHICO

Quer Exprementá, padre?

PADRE

Mantenha o respeito diante de um homem de Deus!

FREIRA

(Como em oração). Glória a Deus, padre! Esse homem tá demoniado...

JUVENTINA

(Revoltada). Oxente! Que negóço é esse de que o padre vai exprementá a macaxeira de Chico? Eu pensei que a minha rimã tava casando cum um home... Mas pelo cu tô veno... (Transição). Tu te ajeita, cabra...

PADRE

Como é que é? Posso começar a cerimônia?

JUVENTINA

Pro favor, padre! Pode começar essa folerastriosa cerimônia...

FREIRA

Vamos reverendo...

JUVENTINA

E acho que o senhor já devia era tá terminando...

PADRE

Vou começar agora mesmo! Meus amigos...

FREIRA

Minhas amigas...

PADRE

Meus irmãos...

FREIRA

Minhas irmãs...

PADRE

Meu pai...

FREIRA

Minha mãe, né pade?

PADRE

Ao noivo...

FREIRA

Rogai por mim, padre...

JUVENTINA

(Com raiva da freira). Mas que bicha mais sem veigonha...

PADRE

A noiva...

FREIRA

Rogai por ela, padre...

PADRE

E sua irmã a dona Juventina...

FREIRA

Tem de piedade nós, padre...

JUVENTINA

(Aos berros). Tu é besta fubana da gota serena encaibada! Tu tá ficano doida? Tu agora vai ter que me expricá o motivo de dizer esse “Tem piedade de nós” Se eu nunca dei a orsadia de falar d’eu, cachorra da mulesta... Vaca desdentada...

FREIRA

(Aos berros). Vaca desdentada é a cachorra que te pariu e a cachorrinha que nasceu... (A Juventina parte cima da Freira e começa a confusão).

PADRE

(Nervosamente tenta separar as duas). Virgem minha nossa senhora das pichototinhas...

CHICO

Eita, padre... O negoço agora fedeu...

GUILHERMINA

(Meio alucinada). Acode, senhora do “O”... Interessante, né, Chico? Tu é quem vai levar gaia e elas é que tão se matando...

PADRE

O pior é que eu tinha certeza que isso ia acabar dando em merda...

GUILHERMINA

Faz arguma coisa, padre... Eita home zurento... Eu num saio daqui sem casoro...

CHICO

Eu também, visse? Já que eu tou na dança, agora eu vou dançar inté o fim...

PADRE

Então vamos separar essas cachorras vadias...

(O padre, o noivo e a noiva, separam a Juventina e a Freira, que ainda continuam com a confusão).

PADRE

(Gritando). Parem com essa cachorrada ou não tem casamento e pronto...

GULHERMINA

Ocês querem parar ou antonse eu vou pedir mais uma aula de macaxeira pro Chico e vai ser sem casamento mermo...

CHICO

Assim tá miorando...

JUVENTINA

(Repreende o Chico). Tá miorando o quê, jumento... (Transição com o padre). Não, pade Tacucunacara... Pelo amo que o senhor tem a sua cueca... Case minha rimã pelo amor do padim Ciço...

PADRE

Tudo bem... Agora eu vou casar... Irmã... Pegue o meu livro de casamento...

FREIRA

Pra já, padre...

PADRE

Em nome do pai, da mãe ou da filha?

TODOS

Da mãe...

PADRE

É pensando na felicidade dessas criaturas desinformadas, que eu resolvi pegar o meu grandioso livro bíblico...

JUVENTINA

Sem muito arrodeio e entre logo no assunto de interesse, padre!

PADRE

Deixe de ser apressada, minha santa... Foi essa mulher folgada, mal feita... Que virou a cabeça desse homem desmiolado... Aqui pra nós... Falta de gosto não falta nesse rapaz...

GUILHERMINA

O que foi que o senhor diche aí, padre?

PADRE

Nada não, minha filhota... Eu apenas falei que você é uma malanfrojada

JUVENTINA

Gostei do elogios, padre...

PADRE

Então eu vou fazer o casório desses dois burricos... (Transição). Senhor Chico Rego Perto, quer casar com a senhorita Guilhermina Piriquito Justo? Também se não quiser, aproveite que a gente pára por aqui e faz de conta que nada aconteceu...

JUVENTINA

Por acaso o senhor é a lei, padre? Sim, porque se for, Justiça eu merma faço... O que é que o senhor tá pensando que eu tou fazendo aqui? Papel de besta?

PADRE

Eu não falei isso... Os seus ouvidos devem estar cheios de cera...

CHICO

Mas num precisa discutir... Eu aceito assim mermo...

PADRE

Bom... Você é quem sabe... (Transição). E tu, mulher... Quer dizer... Senhorita Guilhermina Piriquito Justo... Tu queres casar com esse homem que tá virgem de saber que ser corno?

GUILHERMINA

Tá aprendendo a aduvinhar, padre? Ele sabe eu quero, num é, meu bem?

CHICO

Oxente! E tu num sabe que eu quero também?

PADRE

Então Deus fez e o diabo juntou... Depois não pedir piedade, que eu não dou e pronto e que Deus me perdoe... Estão casados sem o consentimento dos céus...

JUVENTINA

(Grita escandalosamente de alegria). Ahhhiiiii! Ela é mulé do Chico de verdade... Viva o noivo... Viva a noiva...

“A FESTA CONTINUA COM A ENTRADA DA QUADRILHA”

BOAS FESTAS JUNINAS

(FIM).

Flavio Cavalcante
Enviado por Flavio Cavalcante em 23/06/2009
Código do texto: T1663566
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