"CASAMENTO MATUTO PARA QUADRILHAS DE FESTAS JUNINAS (2)" Texto de: Flávio Cavalcante

2º Casamento matuto do ano de 1991

Arraiá: “Oi eu aqui de novo”

Texto

De:

Flávio Cavalcante

Direção: Vicente da quadrilha

Roll dos personagens

NOIVA: JESUÍNA DO RABO ROXO

NOIVO: SINFRÔNIO BUSANFÃ FRÔXO

PADRE: CARADALHO

SACRISTÃO: SIVIRINO ARROXA PEIDO

PAI DA NOIVA: ASTROGILDO BAGO ROXO

MÃE DA NOIVA: CHIQUINHA DO ROBO ROXO

Sinopse

É chegada a hora do casamento. Jesuína do Rabo Roxo, feia de dá nó nas tripas e seu noivo Sinfrônio Busanfã froxo; cujo casamento vai ser realizado pelo padre Caradalho e seu Sacristão Sivirino Arroxa Peido; tendo em parte a mãe da noiva, cachaceira mulestenta e agitadora; Chiquinha do Rabo Roxo e seu macho Astrogildo Bago Roxo. Todos fazem parte de mais um maravilhoso casamento concebido nesse arraiá.

Tudo começa com a Chiquinha, segurando uma garrafa de cachaça, Astrogildo e Sinfrônio, entrando no arraiá.

CHIQUINHA

(Aos berros). Padre... oh padre... Padre, home de Deuso... Eita! Já tou inté de gurgumuío inchado... Pêra aí, que desincha já... (Toma um gole).

SINFRÔNIO

Oi aqui... Reparando bem! Eu num seio pra que tanta pressa pra fazer esse casório... Deus sabe o sacrilégio que eu vou enfrentar...

ASTROGILDO

(Espantado). Oia, Chiquinha... Sacrilégio... Que nome feio é esse? Tá aprendendo a falar difíce, Sinfrônio?

SINFRÔNIO

O nome não é difíce... É difíceú... (Chiquinh dá uma bela gargalhada).

CHIQUINHA

Ai, ai... É com essa que eu me lasco toda!

SINFRÔNIO

(Debochado). O que foi, Chiquinha do Rabo Roxo?

CHIQUINHA

(Revoltada). Tá vendo só, Astrogildo? O fi da peste botou pra brigar... E tu num vai me defender não, é? (Transição). Oi aqui seu Sinfrônio Busanfã Froxo... Eu posso inté tá bêba... Mas não tou doida não, visse? Eu sou uma mulé de respeito!

ASTROGILDO

Eu não digo é nada, proque boca tapada num sai bafo de onça!

CHIQUINHA

(Repreendendo). Ôh, Astrogildo! Tanto que eu ensinei pra tu, pra não falar dessas palavras feia na frente do povo... Oi é farta de educação... Tem que falar bonito, mas, também tu só abre a boca pra fazer veigonha, home de Deuso!

SINFRÔNIO

(Dar uma gostosa gargalhada; mas, Chiquinha a Astrogildo ficam sério e Sinfrônio quando nota que todos ficaram sério, ele fica sem envergonhado. De repente ouve-se um barulho forte e entra o padre sentado num carro de mão, empurrado por Sivirino Arrocha Peido “O Sacristão”. O Sacristão empurra o carro

CHIQUINHA

(Rindo). Oia... O padre lascou-se!

PADRE

(Furioso). Pera aí que eu vou te lascar aqora... (É segurado pelo fortemente pelo sacristão e o Sinfrônio e a Chiquinha pelo Astrogildo).

CHIQUINHA

(Aos berros). Me larga! Me larga, home... Me larga... Eu dou um boi pra num entrar numa briga! E dou uma boiada pra não sair dela! O senhor tá pensando o que, padre caraio...

PADRE

(Repreendendo). Caradalho... Não confunda... Caradalho, ouviu?

CHUIQUINHA

Vá lá que seja...

PADRE

(Com o Sacristão). Oh Sivirino... Quanto foi o apurado hoje?

SIVIRINO

Uma mixaria... Só deu isso aqui, oh...

PADRE

(Furioso). Isso é uma peste mesmo! Isso é uma bobônica da peste, tanto que quero ficar rica, mas estas pestes não colaboram...

CHIQUINHA

E por acaso... Estas pestes... Eu tou incruída?

SINFRÔNIO

Ele num falou falou com a senhora... (Transição). O que foi, padre? Tá nervoso, é?

CHIQUINHA

Ah, bom... Acho muito mermo! O pobrema é que ele deve tá cum febre...

ASTROGILDO

Quando ver esta coisinha assim, só pode tá com febre mermo!

PADRE

(De salto). Coisinha é a mamãezinha...

CHIQUINHA

(Escandalizada). Eita peste! E já tá falando na mãe, é? Aí é caso de briga! Quem cospe primeiro... (Bota a mão na frente).

SINFRÔNIO

Quem der o primeiro tapa dessa vez eu tomo um gole...

ASTROGILDO

Vamos acabar com isso, porque o cachorro aqui não late acompanhado...

CHIQUINHA

(Chamando a atenção do Astrogildo). Xiiiii...

PADRE

E por acaso esse cachorro... Sou eu, senhor Astrogildo?

SIVIRINO

É não, padre... Ele não quis dizer isso não...

PADRE

E é da tua conta, Sivirino? Quem te chamou na conversa dos homens? (Transição). Mas finalmente... O que você vieram fazer aqui?

ATROGILDO E CHIQUINHA

Casar nossa fia...

ASTROGILDO

Oh! Seu pade... Eu inté me emociono quando falo da minha fia... É a coisa mais linda que Deus botou nesse mundo...

SINFRÔNIO

(Tosse). Eita exagero da bobônica da peste!

CHIQUINHA

Linda não... É bonita, né, Astrogildo? Tu também é exagerado como a peste!

PADRE

Já viu coruja achar os filhos feios, dona Chiquinha...

CHIQUINHA

(Com raiva). Dobre a língua, padre... Eu não sou coruja não, visse?

SIVIRINO

Oxente! E cadê a mulestenta?

PADRE

Bem dito, Sivirino... Bendito! Onde está a catraia?

CHIQUINHA

(Levanta a garrafa). Eita desgrameira! Já tá fazendo efeito essa desgraçada aqui... Mas deixa eu tomar mais um gole pras idéia clarear mais ainda... (Tome um gole e limpa a boca com o braço).

PADRE

... Mas cachaceira é a bexiga mesmo...

SINFRÔNIO

A fia é pior do que mãe...

CHIQUINHA

Tu num fala mal da minha fia não, que eu corto teus quiba cabra... É bem verdade que ela diche que num vinha casar nem amarrada...

ASTROGILDO

Aquela cabrita tá que nem mulé ruim... Só vai na porrada...

PADRE

(Repreende). Que porrada? Que porrada? Tá pensando que minha igreja é cadeia, que o senhor chegar e dar porrada e pronto, é? Aqui não vem que não tem...

ASTROGILDO

E quem diche que a sua igreja é cadeia? O senhor por acaso tá ficando doido, padre? E pior é o senhor que não consegue viver sem enganar o povo! Se tem batizado tem que coçar o bolso do padre... Se tem casamento, tem que abanar o bolso do padre... Desse jeito não há peste de bolso que agüente...

CHIQUINHA

Astrogildo... Tu demorou pra falar... Mas também quando tu abriu o bico, acabou cum a raça do padre... Dessa vez tu botou quente em cima do velho... (Transição com o padre). E tu num reage não, é, padre?

SIVIRINO

Eu tô pra vê o pau cantar...

PADRE

Vai cantar nas suas costas se você não trouxer a mulher pra cá...

ASTROGILDO

E ele vai só, é? Padre, o senhor não conhece a minha fia... Ela é boazinha num sabe... Mas tem um defeito que acaba cum ela... Quando emperra, oi... Parece jumento quando tá atolado... Quando pára e diz que não vai fazer alguma coisa... Nem padre Ciço pedindo ela obedece! Mulé ruim de corte igual aquela minha fia... Eu tô pra ver...

PADRE

Eu não quero saber quem botou a cor na burra quando ela foge! Já entrou na dança, agora tem que dançar... Eu quero a mulher aqui, mas, nem que eu tenha que buscar o delegado da cidade...

SINFRÔNIO

(Chamando a atenção). Padre... Padre... Oh, padre Caraio...

PADRE

(Repreende com raiva). Ca-ra-da-lho... Caradalho... Repita... (Segurando na beca do Sinfrônio).

SINFRÔNIO

Caradalho... (Transição). Mas, padre... A mulé tá manifestada na gota serena... Cismou cum a minha cara e diche pra todo que num quer casar e pronto...

PADRE

(De salto). O que? Ela disse isso? E eu vou ter prejuízo só por causa de capricho de uma cabrita?

CHIQUINHA

Pera aí, padre... O sô num acha que tá indo longe demais não? Quem tem que chamar ela de cabrita é eu, que sou mãe dela... O sô devia botar sua língua...

PADRE

(Repreende). Mantenha a postura e o respeito, dona Chiquinha... E tem mais... Entrou na minha igreja, tem que pagar... Se o problema é casamento ela vai ter que casar eu não vou deixar de receber esse dinheiro, mas, nem que eu mesmo tenha que ir busca-la... (Transição). Sivirino...

SIVIRINO

Tô aqui, padre...

PADRE

Vá com o seu Sinfrônio buscar o mulher... Mas traga de qualquer jeito... Porque se não, a gente conversa mais tarde... (Insinuando alguma coisa).

SIVIRINO

(Botando a mão na bunda). Não, padre... De novo não... Pode ficar com tranqüilidade, que a gente trás...

ASTROGILDO

Eu preciso ir também pra acalmar a onça pintada...

PADRE

Acho bom mesmo... Vão depressa... (Os três saem de cena).

CHIQUINHA

Ah, eu também...

PADRE

Baixe seu facho porque panela que muito mexe, sai insosso ou salgado... Vamos arrumar o altar pra quando a cabrita chegar...

CHIQUINHA

(Com raiva). De novo, padre? Desse jeito o sô tá querendo escuiambar cum a minha cara... Mais respeito cum a minha fia! Eu tô bêba, mas não tô doida e também não tô môca das oiças não, visse? Sim, padre... Mas a gente ainda não acertou o preço do casoro...

PADRE

Isso depois se acerta...

CHIQUINHA

De jeito nenhum... Eu quero acertar agora... Primeiro pro que depois da merda cagada, o senhor pode cobrar o preço que quiser... E eu feito uma besta tenho que pagar... E depois dever a pobre dar um azar da desgraceira...

PADRE

Sem exagero, dona Chiquinha...

CHIQUINHA

Mas, pode ir logo falando no tostão, que eu vou preparando as oiças pra ouvir bem! Agora veja bem o que o senhor vai cobrar, se não, o senhor é que vai ter que pagar pra fazer o meu enterro, depois que eu tomar o susto...

PADRE

Tá bom, dona Chiquinha do rabo roxo... A senhora me dá cem mango e tá tudo certo... O santo vai santo vai sorrir de alegria...

CHIQUINHA

O seu bolso também, né, padre... Eu pago... O senhor divide em quinze vez sem juro... e a primeira eu pago só daqui a dois ano... É pega ou largar...

PADRE

De jeito nenhum! Eu não tou passando fome! Mas pensando melhor eu vou fazer de graça... Só pra me ver livre de vocês...

CHIQUINHA

Ai, home... Graças a Deus... (Ouve-se um barulho e muita confusão. Jesuína do Rabo Roxo é trazida pelo: Sacristão, o Astrogildo e o Sinfrônio, à força).

ASTROGILDO

(Entrando em cena). É isso mermo... Pode se espernear, mas nem que seja na base da porrada tu vai ter que se casar cum Sinfrônio...

SIVIRINO

(Grita de dor). Aiiii... Desgraçada me mordeu...

JESUÍNA

(Aos gritos). Ai, ai, ai,... Me larga... Eu num quero me casar... Me larga bando de peste! Minha mãe diche que dói... Ai, ai, ai... Vai doer...

CHIQUINHA

Cuidado cum a minha fia...

PADRE

Trás ela pra cá...

JESUÍNA

Eu já diche que num caso e num caso mermo! Minha mãe diche que dói e meu pai diche que eu ia ficar inchada...

PADRE

(Amenizando). Não dói não, minha filha...! Sua mãe casou e não doeu nada... Sua vó casou e não doeu... Agora você...

JESUÍNA

(Insinuando alguma coisa). Oxente! Como é que tu sabe disso?

SIVIRINO

Estranho mermo, padre... Como é que o senhor sabe disso?

PADRE

Home! Deixa isso pra lá... Não vamos mexer com o que tá quieto...

CHIQUINHA

Home tu quer saber de uma coisa? Oi... côco quanto mais mexe, mais fede... Vamos começar logo esse casamento...

JESUÍNA

Vai feder se a senhora num botar pra fora essa coisa que tá aí escondida... (Jesuína aponta para a braguilha do Astrogildo e todos olham com malícia).

CHIQUINHA

Oh, Jesuína de Jesui... Home tu pá com a tua cachorrada! Tu num tá vendo que aqui num é lugar pra mostrar as coisa de teu pai? Padre essa minha fia tá indo longe demais... Num seio cum quem essa menina aprendeu essas coisa feia... Pro favor... Comece logo o seimão, enquanto eu tomo um gole...

PADRE

Pra já, Chiquinha do rabo roxo...

CHIQUINHA

Só quem pode chamar rabo roxo é o padre... Ihhh... Parece que a cachaça fez a minha cabeça! Tô bebinha... E pra o senhor num ter tanto trabalho, quem vai casar essa cachorra é eu... Em nome do padre, do fio e do esprito santo a mãe... (Chiquinha benze os noivos com um ramo de mato e na última benzedura, benze com muita força nos testículos do Sinfrônio e o mesmo dá um grito de dor).

SINFRÔNIO

Eita bexiguenta da peste! Quer me aleijar?

SIVIRINO

Coitado do bichinho do Sinfrônio, Chiquinha...

JESUÍNA

Ai... Ai... Mainha quase aleijou o bichinho...

PADRE

Tá vendo só, dona Chiquinha? O homem agora não é mais de nada e agora nem são Jorge descendo com a sua espanta e matando o dragão de novo vai dar jeito...

CHIQUINHA

Peraí! Deixa eu tomar outro gole que já já, aparece outra idéia...

SIVIRINO

Vai gostar de beber assim na casa da peste!

PADRE

Eu não preciso de sua idéia... Olhe só o prejuízo que senhora deu... Acabou com a lua de mel do rapaz...

JESUÍNA

Ah! Mas, não vai acabar mermo! Oi, seu pade... Pode começar o casoro e deixe o resto comigo... Porque o pau que nasce torto, morre torto... Mas comigo é diferente! Ele tem é que ficar em pé ou eu não me chamo Jesuína do rabo roxo... Mulé de sangue no olho e que num cochicha e home pra me agüentar tem que subir na parede que nem lagartixa...

PADRE

Tudo bem... Se é assim, eu caso... Senhorita Jesuína do Rabo Roxo... Queres casar com Sinfrônio Busanfã froxo... Esse homem que não é mais homem?

TODOS

Epa!

SIVIRINO

Eu já vinha desconfiando...

PADRE

É um trabalhador honesto...

JESUÍNA

(Dá uma risadinha sem vergonha). Ah! Aceito!

PADRE

E promete ser fiel a ele, mesmo sabendo que na primeira noite de lua de mel ele vai brochar?

JESUÍNA

Ah, padre... Isso eu não prometo não... Ele nunca levou ponta na vida... Não levante essa peste que ele vai ver só...

PADRE

(Rindo). Ela tá brincando... O senhor Sinfrônio Busanfã Froxo! Aceita a senhorita Jesuína do Rabo Roxo, essa mulher que se disputa... Como tua mulher e promete carregar essa cruz, mesmo sabendo que a qualquer momento sua cabeça vai ficar toda enfeitada? Que Deus me perdoe, mas, eu não aceitava nem morto...

SINFRÔNIO

O senhor não aceita, porque não ama como eu amo... Eu aceito... (Com sorriso de satisfação).

PADRE

Então enfia o dedo na roda dela, homem...

SIVIRINO

Oxente é na roda!

SINFRÔNIO

Oxente... Ficar folgado, padre...

PADRE

Então enfia a mão meu filho...

SIVIRINO

(Espantado). Misericórdia... A mão?

PADRE

É mão mesmo! E pra encerrar esse casório, quero saber se tem alguém que vai enfiar a língua no... Casório, apareça logo e não tiver, enfie a língua no... Lugar onde tava... Viva os noivos...

TODOS

Viva... (O final deste casamento fica a critério do diretor).

(Fim).

BOAS FESTAS JUNINAS

Flavio Cavalcante
Enviado por Flavio Cavalcante em 21/06/2009
Código do texto: T1659861
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