Cid - Pierre Corneille

Pierre Corneille – CID

Venho a algum tempo apreciando a leitura de peças teatrais. Seja pelo texto, pelas idéias abordadas, seja pelo fato de lê-las com a ânsia de interpretação. O que dá um gosto a mais a leitura. Nos transportando mais fielmente para o ambiente.

No final da década de 30 no século XVII Corneille escreve Cid. Não sei muito do contexto e da evolução das peças. Mas sei que veio anteriormente ao marco derradeiro da tragédia que foi Shakespeare.

Em certa medida os versos não são tão elaborados e lapidados quanto, mas se há algo de agradável em Corneille é sua capacidade para fazer toda a trama rodear em um curto espaço de tempo colocando questões centrais em ambientes reduzidos, deixando muito mais para os diálogos nosso estupor, nossa alegria e contentamento.

Nessa peça o tema central é a honra. Todo o cerne moral do texto gira ao redor da honra ferida. Passando pela vingança e o seu paralelo com o amor. Vemos personagens conhecedores de si mesmos a tal ponto de saberem o querem, saberem o que devem fazer, e mesmo assim contradizer todo o próprio pensamento.

A trama se passa, basicamente em um castelo. Onde um Conde, pai de Chimene, insulta gravemente o pai de Roderick, Don Diegue. Esse enamorado de Chimene, que correspondia plenamente seus sentimentos. É então que Diegue já velho, pois serviu durante muito tempo ao Rei em muitas aventuras, não consegue se defender direito do escárnio do Conde e pede a Roderick para vingar-se e recuperar a honra perdida com o insulto mortal.

É então que toda a trama gira. O infortúnio de Roderick em ter que vingar o pai, matando o pai da amada. Da amada que amando Roderick, se sente angustiada, pois a honra de seu pai também está em jogo. Dentre outros personagens menores que contribuem para uma apimentada a mais no texto.

A honra, se percebe, era de tal importância que se tornava assunto mortal. Rixas não ficavam em pouca conta. Mas o mais tangível é a dualidade da moral dos personagens. Obrigados a sempre agirem de acordo com os preceitos da época, defendendo a honra, ignorando seus sentimentos internos, ou tomando o sofrimento com propriedade por eles.

Roderick ao ir vingar seu pai, tem plena consciência que perderá sua amante. Mas o faz mesmo assim. Assim como quando Chimene pede ao Rei justiça pela morte do pai, Roderick se mostra digno de punição pelo que fez. Os personagens agem de acordo com todo uma organização do pensamento superando o interior do sentimento. Mesmo sendo punível com a vida Roderick tinha que vingar o pai, e mesmo se fosse condenado, o seria com honra.

Destilando toda a trama com diálogos gostosos de ler Cornielle nos mostra um pedaço de normalidade com preceitos maiores, como a trama, mesmo sendo casual, para a época, tem sua mostra da alma dos personagens. Que em momento algum, transparecem serem seres reais, mas por isso que vemos tudo com tanta intensidade. São personagens de fato. Longe de uma normalidade, não tenho com avaliar o comportamento das pessoas da época, mas muito cônscios de si mesmos. E só isso já basta para que seja delicioso ler a peça.

Estamos em um momento em que os personagens agem por impulso, a coisa é toda muito impulsiva. Estamos numa época em que o narrador nos explana toda a pisque de seus manipulados para que possamos no simpatizar com eles. Nessas peças vemos o próprio personagem conhecedor de si explanar-nos, explanando para os demais personagens, seus pensamentos, seus sentimentos. De suas próprias bocas sai todo o seu sentimento.

Ficamos ainda mais comovidos quando Roderick ao saber de sua ofensa grave em relação a amada, se oferece para que ela, com suas próprias mãos o mate, tirando sua vida, que não tinha mais sentido senão com ela. Ela entretanto pede ao Rei por justiça, mas incapaz de fazê-la, e em certa medida incapaz de a querer de fato, só a desejando pela honra que lhe foi ferida.

Como vemos na tragédia os personagens escolhem o sofrimento em sua reclusão a aceitar totalmente o que sentem e sobreporem isso ao que acontece a sua volta. E uma atenção a parte vai para o contraponto dessa realidade fantástica. As amas das damas são o contraponto ideal dessa visão. Mais centradas, elas vêem mais na razão os atos que no impulso social para as ações. Em suas conversas a imagem é muito mais importante para os nobres que para as amas que tendem a serem mais fiéis aos seus sentimentos, não importando muito o que o ambiente social pensa deles.

Não é um texto fenomenal, tanto quanto vemos em gigantes da literatura. Mas contando que Cornielle veio antes e em certo ponto tem sua importância, fica gostoso de ler sua tragédia. É mais que válido, chega a ser prazeroso ler Cid. Recomendo.

leandroDiniz
Enviado por leandroDiniz em 31/03/2006
Código do texto: T131617
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