A Fortaleza de neve - um conto espiritual
“Tanto tempo quanto dure o espaço,
Tanto tempo quanto existam os seres
Possa eu também subsistir
Para dissipar a dor no mundo” página 114
Nesse ano de 2008, algo singular aconteceu. Monges budistas em várias regiões da Ásia, marcharam pela abertura política e o fim de regimes ditatoriais, além da independência do Tibete, arregimetando o povo, a resposta dos governos criticados nas manisfestações foi uma dura represália, tanto em Mianmar como na China. Em meio a essas notícias sobre revoltas populares incitadas pelos monges, um livro chegou às livrarias recentemente, escrito pelo monge Mathieu Ricard, um cientista francês que abandonou a carreira para seguir os passos de Buda, que aborda um lado conhecido dos ensinamentos budistas.
A Fortaleza de neve – um conto espiritual (La citadelle des neiges, tradução de Marcos Marcionilo, Ediouro, páginas, R$), a primeira empreitada de Ricard no conto, o autor é um renomado ensaísta, best seller, como foi com Le moine et le philosophe (O monge e o filósofo)
A narrativa se passa, no extremo do mundo, lá pelo Himalaia, onde vive Détchèn, um jovem butanês, que demonstra deste cedo ser uma pessoa de generosidade e compaixão a qualquer ser vivo, uma ação acima do normal, mas que cresceu como outras crianças de sua aldeia, aos pés da cordilheira, sem conhecer os caminhos espirituais. Até que certo dia, seu tio o escolheu para ser enviado a Fortaleza de Neve, um lugar afastado, no meio de uns picos elevados, onde vivem monges isolados de todos. Assim começou a sua viagem de iniciação, espiritual ao coração da grandiosa natureza, uma jornada que lhe conduzirá ao caminho do Despertar.
“A Fortaleza de Neve era, com efeito, um lugar sagrado, situado ao largo de todas as estradas e de todas as aldeias, um dos grandes lugares sagrados, inde meditou Padmasamnhava, o “Mestre Nascido do Lótus”, também conhecido pelo nome de guru Rinpochè, que nos séculos VIII e IX, fez o budismo floresecer no Tibete(...)” página 38
O jovem se tornará discípulo de um grande mestre, Tokdèn Rinpoche, e irá realizar um retiro em uma caverna erma, se alimentando da partilha da comida de alguns camponeses. Ricard nos transporta à beleza das paisagens himalaias, como se estivessemos caminhando junto com Détchèn em sua jornada. “(...)viveria os momentos mais decisivos de sua existência, a riqueza e a solenidade do momento. Sua expectativa era, ao mesmo tempo, solene e alegre, um impulso interior marcado pelo respeito e pela curiosidade” páginas 41
As descrições lembram um documentário sobre o lugar, e pela simplicidade da história vemos um conto comovente, que nos mostra a descoberta de um lugar mitíco, de um país onde a natureza é concreta, nos faz meditar sobre a realidade, sobre a filosofia da vida tranquila e cordial. Seria isso que os manisfestantes monges desejam? A resposta, iremos ter com o tempo, mas no livro de Ricard descobrimos como é a vida de uma pessoa que sente o desejo de seguir o budismo. Ao estilo filosófico de Paulo Coelho e de Maxence Fermine, o livro encantará pela bela introdução ao budismo, incluindo todos os grandes princípios são abordados: samsara, impermanência, descompromisso, compaixão, meditação, retiro espiritual e o Despertar.
Um pequeno manual de iniciação, bem diferente dos conhecidos livro de auto-ajuda que vemos nas prateleiras, com poesia e sabedoria ao toque desta bela ficção que abre as portas da serenidade a quem o ler. Seria interessante, os ditadores de Mianmar e o governo chinês o lerem.
Mathieu Ricard (1946) é filho do filósofo francês Jean-François Revel. As suas principais credenciais científicas incluem o doutoramento em Genética Molecular, obtido no Instituto Pasteur, em Paris, e o trabalho que desenvolveu sob a direcção do Prémio Nobel François Jacob. Posteriormente abandonou a investigação científica para se tornar monge budista tibetano nos Himalaias. Desempenha as funções de secretário particular e intérprete de S.S. o Dalai Lama.