MANUAL DO ROTEIRO, de Syd Field
Personagem é ação. Esta é uma regra simples que, na prática, auxilia os escritores novatos a desenvolverem melhor a sua escrita. O norte-americano Syd Field escreveu em 1979 um livro clássico sobre técnicas de escrita, o Manual do Roteiro, que aborda de maneira simples regras eficazes da criação literária. Apesar do objetivo principal do livro ser ensinar a escrita de roteiros para cinema, as orientações - além servirem para roteiristas - são úteis para romancistas, contistas, escritores, etc., desde que saibam separar o que lhes será útil.
A obra aborda aspectos essenciais na composição, tais como: o assunto sobre o qual escrever, a construção e criação de personagens, a escrita de finais e inícios e estruturação do roteiro da trama. Isso é feito com o auxílio de roteiros de alguns filmes famosos, com trechos de cenas para exemplificar cada passo a ser dado.
Para Field, a história é dividida em três partes, um Paradigma encontrado em todo roteiro, assim como na vida humana:
1. início, apresentação ou Ato I;
2. meio, confrontação ou Ato II;
3. fim, resolução ou Ato III.
Os elos entre os Atos são os Pontos de Virada (plot points), responsáveis em fazer com que o leitor/espectador fique curioso e continue lendo/assistindo a trama até o fim. "É um incidente, ou evento, que "engancha" na ação e a reverte noutra direção. Ele move a história adiante" (pg. 97).
Para Field "Todo drama é conflito. Sem conflito não há personagem; sem personagem, não há ação; sem ação, não há história; e sem história, não há roteiro" (pg. 5). Ou seja, o personagem precisa sempre ter uma necessidade e a trama girará em torno das dificuldades a serem vencidas por ele para satisfazer aquela necessidade. Sabendo qual a necessidade do personagem, pode-se criar dificuldades para ele vencer e avançar na história. Por isso, aquela velha idéia de começar a escrever sem ter rumo certo é descartada em prol de uma estrutura lógica , racional e bem sucedida.
"O mesmo princípio se aplica a uma receita. Quando você cozinha algo, você não mistura as coisas e espera para ver no que dá! Você sabe o que vai cozinhar antes de entrar na cozinha; tudo o que você tem que fazer é cozinhar." (pg. 53)
A estória pode surgir à partir do perfil de um personagem: "crie um personagem e você criará uma história" (pg. 34); ou em um roteiro pré-definido os personagens vão sendo acrescentados conforme a necessidade. Indiana Jones e a Arca Perdida começou a ser escrito pela cena final, a do depósito gigantesco com caixas de artefatos guardadas pelo governo. Os aspectos internos e externos formam e definem o personagem, seja na sua biografia, necessidades ou vidas profissional, pessoal e privada.
Outra regra do Manual do Roteiro é prender a atenção ainda nas primeiras dez páginas do roteiro ou dez minutos do filme. Se demorar mais que isso corre-se o risco do leitor/espectador perder o interesse. "Nas dez primeiras páginas o leitr saberá se sua história funciona ou não; se foi bem apresentada ou não" (pg. 57). Cada seqüência, cada cena precisa se encaixar no momento exato, sem excessos.
No capítulo "Adaptação", Field dá uma ótima explicação do porquê de filmes baseados em livros serem diferentes dos originais. Roteiros adaptados são obras originais assim como os livros o são. Não se deve confundir o uso de uma fonte com o tipo de veículo comunicativo. Em "Sobre a Colaboração" aparecem orientações de como dois escritores podem escrever uma obra em conjunto sem se matarem durante o processo. "Depois de Escrito" traz conselhos para a fase pós-escrita, em que a preservação dos direitos autorais, publicação e roteirização da sua obra são extremamente relevantes.
Os capítulos "Construindo o Roteiro" e "Escrevendo o Roteiro" já valem o livro todo. São uma injeção de ânimo em qualquer escritor iniciante, e aparecem permeados de conselhos valiosíssimos. Apesar de alguns capítulos não serem úteis hoje em dia, como o "Escrevendo em Computadores" onde o autor aborda as dificuldades dos escritores na transição entre a máquina de escrever e o computador, esses capítulos não desmerecem os méritos finais do livro. Syd Field conclui aplicando uma de suas regras sobre criação de personagens ao próprio escritor: personagem é ação. Escritor é ação. Por isso, a melhor maneira de tornar-se um grande escritor é escrevendo.
Retirado de www.jefferson.blog.br