Resenha impressionista para "Prazer e sofrimento com informática"
"A informática no Brasil: prazer e sofrimento no trabalho", de Álvaro Roberto Crespo Merlo, é um livro interessante, que aborda os principais problemas de saúde dos profissionais de informática, relacionando tais problemas ao modo de trabalho das empresas. Destaco a análise dos problemas de saúde dos analistas de informática, pois foi a parte que mais me interessou, embora ocupasse pouco das 270 páginas da obra.
Por ser uma tese de doutorado, o texto estava bem estruturado, com seus capítulos praticamente independentes. A metodologia de multidisciplinaridade utilizada na abordagem do estudo de caso me chamou a atenção por parecer realmente a mais adequada para lidar com um tema tão multifacetado como o estudo conjunto de saúde, informática, trabalho, empresas... A linguagem é clara, embora com palavras "de nível". Há inúmeras referências diretas a outras obras e também (muito interessante) transcrições de entrevistas com profissionais, o que trouxe bastante realismo e confiabilidade ao relato.
Considerei interessante que o resultado do estudo foi, além da pesquisa e da busca de causas para o "fenômeno" das doenças/marcas do trabalho em informatas, o relato de suas conquistas no sentido de reverter esse quadro. Considerei interessante a insistência do autor em dizer que as lutas dos sindicatos eram para realmente melhorar as condições de trabalho das pessoas, e combater a "consciência culposa" incutida de maneira sutil pelas empresas. Há muitas "chamadas" para mudanças, conscientizações e tudo o mais, para não deixar que os trabalhadores aceitem trabalhar sob condições insalubres só para ganhar um adicional (pobre!). Aliás, a obra é até um pouco revolucionária, pois denuncia a discriminação em relação às mulheres e aos trabalhadores de menor rendimento, o que cria uma "lógica de exclusão", que deve ser combatida a todo custo com conscientização e ação coletiva!
TRECHOS:
17 Taylorismo: análise, simplificação, adaptação de instrumentos técnicos, pré-definição das tarefas.
26 Lesões por Esforço Repetitivo (LER) é um conceito que define um conjunto de doenças ou alterações funcionais que atingem a região escapular, o pescoço, os ombros, os braços, os cotovelos, os antebraços, os punhos e os dedos. As doenças que fazem parte da LER podem ser divididas em: tendíneas inflamatórias (tenossinovite ocupacional), Dedo em Gatilho, Síndrome de De Quervain, tendinite da cabeça longa do bíceps, tendinite do supra-espinhoso, epicondilite lateral e medial), nervosas periféricas compressivas (síndrome do desfiladeiro torácico, síndrome do supinador, síndrome do pronador redondo, síndrome do túnel cubital, síndrome do túnel do carpo, síndrome do canal de Guyon) e outras (síndrome tensional do pescoço, cisto sinovial, radiculopatia cervical, síndrome miofascial, fibromialgia) (Hoefel, 1996).
38 Para Dejours (1987), o sofrimento é um espaço clínico intermediário que marca a evolução de uma luta: "uma luta entre funcionamento psíquico e mecanismo de defesa por um lado, pressões organizacionais desestabilizantes por outro lado, com o objetivo de conjurar a descompensação e de conservar, apesar de tudo, um equilíbrio possível mesmo se ele ocorre ao preço de um sofrimento e com a condição que ele preserve o conformismo aparente do comportamento e satisfaça aos critérios sociais de normalidade".
52 Como afirma Marx (1969, p.270): "a continuidade de um trabalho uniforme destrói a tensão e o impulso dos espíritos vitais, os quais se encontram recriados e estimulados pela própria mudança de atividade".
62 Para Fayol (1956, p.23): "Este sentimento (a disciplina) é exprimido com grande vigor nos Manuais militares onde se lê: "a disciplina é a principal força dos exércitos". Eu aprovaria sem reserva este aforisma se ele estivesse seguido deste outro: "A disciplina é o que fazem os chefes". Ou, o estado da disciplina de um corpo social qualquer depende essencialmente do valor dos chefes".
64 A terceira fase (da entrada da informática no trabalho de escritório) corresponde à descentralização de certas funções administrativas da empresa, tais como contabilidade, gestão de contas (para os bancos) ou de riscos (para as companhias de seguros), etc.
105 No Brasil, as doenças profissionais são definidas pela legislação relativa aos acidentes de trabalho, mas (...) a legislaçào brasileira prevê 27 agentes, com os quais deve ser estabelecida uma ligaçào de causa e efeito, para que a doença possa ser classificada como profissional.
Agentes: Arsênico e seus compostos arsenicais, Asbesto ou Amianto, Benzeno ou seus homólogos tóxicos, Berílio e seus compostos tóxicos, Bromo, Cádmio ou seus compostos, Carbonetos Metálicos de Tungstênio Sinterizados, Chumbo ou seus compostos tóxicos, Cloro, Cromo ou seus compostos tóxicos, Flúor ou seus compostos txicos, Fósforo ou seus compostos tóxicos, Hidrocarbonetos Alifáticos ou Aromáticos, Iodo, Manganês e seus compostos tóxicos, Mercúrio e seus compostos tóxicos, Monóxido de Carbono, Cianeto de Hidrogênio ou seus derivados tóxicos, Sulfeto de Hidrogênio (Ácido Sulfídrico), Sílica Livre, Sulfeto de Carbono ou Dissulfeto de Carbono, Alcatrão, Breu, Betume, Hulha Mineral, Parafina e produtos ou resíduos desssas substâncias causadores de epiteliomas primitivos da pele, Ruídos e Afecção Auditiva, Vibrações, Ar Comprimido, Radiações Ionizantes, Microorganismos e Parasitas Infecciosos Vivos e seus produtos tóxicos, Algodão, Linho, Cânhamo, Sisal, Agentes Físicos, Químicos ou Biológicos, que afetam a pele, não considerados em outras rubricas (BRASIL, Lei 8.213 de 24/7/1991).
113 (...) Na verdade, todos os indivíduos passam por essa fase durante a infância e geralmente são educados para adquirirem características opostas na idade adulta, isto é, para assumirem responsabilidades e ganharem autonomia. (...) (Ferreira, Maciel, 1988, p.10)
114 O estudo de Ferreira e Maciel (1988, p.12) estabelece, igualmente, uma relação entre o trabalho de digitação e a Perda de Memória Recente: "Uma das questões mais levantadas pelas digitadoras era a dificuldade que elas tinham para ler. Elas tinham dificuldade para reter o que elas estavam lendo, obrigando-as a sempre retornar ao início do texto, o que lhes irritava muito. Ou então, quando terminavam de ler, elas tinham muita dificuldade para explicar o que tinham lido".
117 Como afirma Cottereau (1978, p.195): "Na linguagem dos enquadradores, as mesmas situações que são chamadas de esgotamento e repouso, quando elas se aplicam à burguesia, chamam-se preguiça e absenteísmo quando se aplicam aos trabalhadores. Aplicar aos trabalhadores a terapêutica higieno-dietética seria colocar o mundo de 'pernas para cima' ".
154 Uma das expressões das lutas pela cidadania foi a criação e a rápida ascensão do Partido dos Trabalhadores (PT), que, surgido oficialmente em 1981, em alguns anos, tornou-se a segunda força política do País. Seu candidato às eleições presidenciais de 1990 e 1994 - Luís Inácio Lula da Silva -, ex-metalúrgico e sindicalista, chegou, nos dois casos, ao segundo turno e obteve quase 50% dos votos. O PT nasceu da iniciativa de sindicalistas que queriam ir além das ações sindicais tradicionais e intervir, diretamente, na vida política do País.
169 (parte da NR-17)
17.3 Mobiliário dos postos de trabalho
[...]
17.3.3 Os assentos utilizados nos postos de trabalho devem atender aos seguintes requisitos mínimos de conforto:
a) altura ajustável à estatura do trabalhador e à natureza da função exercida;
b) características de pouca ou nenhuma conformação na base do assento;
c) borda frontal arredondada;
d) encosto com forma levemente adaptada ao corpo para a proteção da região lombar.
17.3.4 Para as atividades em que os trabalhos devam ser realizados sentados, a partir da análise ergonômica do trabalho, poderá ser exigido suporte para os pés que se adapte ao comprimento da perna do trabalhador.
[...]
17.6 Organização do trabalho
17.6.1 A organização do trabalho deve ser adequada às características psicofisiológicas dos trabalhadores e à natureza do trabalho a ser executado.
17.6.2 A organização do trabalho, para efeito desta NR, deve levar em consideração, no mínimo:
a) as normas de produção;
b) o modo operatório;
c) a exigência de tempo;
d) a determinação de conteúdo de tempo;
e) o ritmo de trabalho;
f) o conteúdo das tarefas.
(Fonte: Brasil, 1992, p.210)
217 (xerox)
228 As relações entre os aspectos técnicos e "estéticos" trazem ambigüidades à atividade da análise porque, em geral, os clientes, que não costumam ser capazes de julgar sobre a qualidade da estrutura interna de um programa, valorizaram mais a beleza das imagens. Seguidamente, os analistas são confrontados com o seguinte dilema: empreender um trabalho difícil e penoso, focalizando toda a sua atenção sobre o funcionamento do sistema para produzir um programa que não irá satisfazer o cliente, ou elaborar um programa de má qualidade técnica, mas que agradará em virtude das imagens que o cliente vrá no vídeo.