Jorge Amado: uma biografia - Joselia Aguiar

MUITO BOM: uma biografia bastante completa do escritor baiano que entusiasma mais quando passa a tratar de suas personagens inesquecíveis: Gabriela, Tieta, Tereza Batista, Dona Flor

Joselia Aguiar - Jorge Amado: uma biografia, SP, Todavia, 2018, 640 páginas

Ao terminar de ler o livro de Joselia Aguiar fui ver todos aqueles números referentes à venda dos livros de Jorge Amado (1912-2001), as inúmeras traduções para diversas línguas, reedições aqui e no exterior, adaptações para o teatro, cinema e televisão, teses de mestrado e doutorado, ensaios e artigos sobre sua obra. Fiquei com a impressão de que o autor baiano era o mais importante de nossas letras.

Porém, depois, pesquisando sobre literatura no Estadão, um artigo de Fred Lopes me informava que Machado de Assis (1839-1908) seguia sendo o escritor brasileiro mais celebrado mundialmente, além de ser considerado o maior da literatura brasileira e um dos principais autores da literatura em língua portuguesa. Bem, então Amado ocuparia um honroso segundo lugar nessa história toda.

Uma longa história a de Amado, que a editora Todavia diz ser a mais completa e atualizada biografia dele, mesmo porque a primeira, de Miécio Táti, publicada em 1961, só cobriu sua vida e obra durante cerca de 49 anos, sendo que Amado viveu quase 90 anos. Outras informações se encontravam nos livros de memória dele, como Navegação de Cabotagem (1992) e nos vários volumes escritos por sua mulher, Zélia Gattai (1916-2008).

E Joselia Aguiar reconhece que ainda há muita coisa para ser estudada e pesquisada na vida e na obra do autor de Gabriela, Cravo e Canela. Livro publicado em 1958, de enorme sucesso no mundo todo, cuja primeira tradução no exterior deu-se na Rússia, país que Amado venerava, porque ali era o centro do pensamento de esquerda daqueles anos. (Pela devoção do governo petista a Putin e suas atrocidades na Ucrânia e contra os próprios russos oposicionistas, causa espanto observar o comportamento da atual esquerda brasileira nessas questões e outras.)

Curiosamente, Gabriela marca uma transição do autor político das primeiras publicações carregadas de ideologia, como em Terras do Sem-Fim (1943), para algo que “as resenhas americanas se referiam (...) como “divertido e cativante”; de “atmosfera contagiante, erótica, violenta, cheia de cores chamativas e de episódios inesperados”, conforme cita a biógrafa. Justamente quando trata desse “novo” Jorge Amado, num capítulo (o 28) intitulado Gabrielamania, o livro de Joselia Aguiar fica um pouco mais interessante.

Porque até ali, tratando muito da vida política de Amado, que foi bastante intensa, confesso que andei bocejando por conta de tanto Luís Carlos Prestes, Partido Comunista Brasileiro, Getúlio Vargas etc. Depois acompanhamos o desencanto dele e de Zélia com a ditadura soviética sob Stalin e com o avanço da idade encontramos Amado muito amigo de Antonio Carlos Magalhães e José Sarney, embora permanecesse fiel à esquerda, não misturasse amizade com ideologia, como ele pensava.

Bom mesmo foi saber que havia quase uma fraternidade entre os grandes escritores e pensadores contemporâneos de Amado, gente que trocava cartas e conversas, enviava capítulos ou trechos de seus livros para que o outro escritor apreciasse e fixesse sugestões, que podiam ou não ser acatadas, enfim, eram gente como Erico Veríssimo, Graciliano Ramos, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, José Lins do Rego, Guimarães Rosa, Mario de Andrade e ainda em outras áreas Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Oscar Niemeyer etc.

Mas isso é apenas um pouco do que o leitor vai encontrar em Jorge Amado: uma biografia. Que é quase tão interessante quanto Clarice, de Benjamin Moser (sobre Clarice Lispector) ou O Anjo Pornográfico, de Ruy Castro (sobre Nelson Rodrigues), duas ótimas biografias sobre autores brasileiros que me vieram à memória durante essa leitura e a comparação então foi inevitável.