Três homens num barco - Jerome K. Jerome

Muito bom: um passeio divertido e cheio de histórias e confusões ao longo do rio Tâmisa lá pelos idos de 1889

Jerome K. Jerome - Três homens num barco (Já para não falar do cão), Lisboa, Relógio D'Água, 2022

Salvo engano meu, no Brasil nunca foi publicada a tradução do original de 1889 de Três Homens Num Barco, que virou livro cult na Inglaterra. Houve aqui apenas uma adaptação para jovens pela antiga editora Ediouro sob o título de Três Garotos Num Barco (Adaptado) em 1973. Cheguei à tradução integral portuguesa pouco tempo depois de ter lido do mesmo autor, Jerome K. Jerome (1859-1927), Devaneios Ociosos de Um Desocupado, um livro bastante engraçado e cheio de curiosas reflexões.

Três Homens Num Barco tem como personagens o próprio Jerome, o narrador, George, Harris, seus amigos, e o cão do subtítulo, Montmorency, animal fictício, ao contrário dos três jovens, que eram amigos de verdade, reais. Jerome nos conta a história de uma caótica e hilariante viagem de barco de duas semanas pelo rio Tâmisa entre Kingston e Oxford e depois o retorno a Kingston. Apesar de tudo dar continuamente errado, e daí vem justamente a graça do livro, os três conseguem levar a cabo esse passeio cheio de incidentes, confusões, aventuras e peripécias.

Mesmo tendo sido publicado há 135 anos passados, a narrativa de Jerome mantém um frescor que a torna interessante ainda hoje, a ponto de The Guardian tê-la considerado recentemente um dos 25 melhores romances de sempre, e a revista Esquire um dos 20 livros mais divertidos já publicados. Tem humor, sátira social, alguma filosofia de vida e um elogio à vida ao ar livre e à amizade. Ainda hoje, segundo o que li na internet, grupos de fãs do livro tentam refazer de barco, obviamente, o mesmo roteiro que os três amigos fizeram há muito tempo.

Jerome, George e Harris decidem fazer a viagem porque era verão e se sentiam muito sedentários, inválidos mesmo, precisavam ir para o ar livre, movimentar seus corpos. E aí Jerome aproveita para contar que tendo um dia ido ao Museu Britânico pesquisar num livro sobre alguns sintomas que andava sentindo, sintomas de febre do feno, ao começar a leitura logo sentiu que estava mesmo doente. Vai então ao médico, que após a consulta lhe diz que não iria contar tudo o que ele tinha, porque a vida era breve e Jerome poderia morrer antes de ele acabar de relacionar todos os seus males. Pois é...

E assim vai, tudo é um tanto exagerado, cada capítulo tem praticamente uma história inusitada ou o registro de um fato pitoresco ocorrido com um deles ou com algum conhecido. Enquanto navegam pelo Tâmisa ou se hospedam em pequenas cidades ou vilas ao longo do percurso, mais histórias pitorescas do passado vão se sucedendo. Como a hilariante narrativa de Jerome sobre um queijo bastante fedido, cujo cheiro podia ser sentido a quilômetros de distância e que ele, a pedido do dono, seu amigo, teve de levar de Liverpool para Londres. No final, fedia tanto que teve de ser enterrado.

Enfim, Três Homens e Um Barco é um livro cômico, mas que na origem era para ser um livro de viagem, turismo, contando relatos de fatos verídicos passados ao longo do percurso do Tãmisa entre Kingston e Oxford, tudo o que os viajantes poderiam usufruir ou conhecer ao longo do passeio. Mas deu no que deu, com a ficção invadindo a realidade, para nossa sorte de leitores.