JÁ TENTEI CALAR-ME - Do livro EU, de Theresa Nallene - Resenha Literária
1. FICHA TÉCNICA
Título: EU
Autor: Theresa Nallene
Edição: Ésobrenós Editora
Ano: Maio, 2023
N° de páginas: 116
Género: Ensaístico
Formato: Impresso
1.2. DADOS CATALOGRÁFICOS
"EU", assim se intitula a obra, escrito pela nossa querida escritora angolana Theresa Nallene, publicada pela Ésobrenós Editora, a 27 de Maio de 2023, sendo a segunda obra literária da autora, fazendo parte do Kit "Livros Escritos da Alma", junto do livro "Resgatando a Essência", sua obra de estreia. É uma obra composta de 65 textos, o verso e a prosa mescladas no seu criar, frases, pensamentos, poemas, ensaios, lapidando o seu sentido todo, escritos num eu que alberga todos os pronomes pessoais.
Antes de avançar com a abordagem, valendo alguma nota sobre a sua estrutura, agradou-me bastante a simplicidade da capa, a visão de uma paisagem que figura a serenidade do mar ao pôr do sol, centralizada numa figura humana e a opacidade do fundo, uma combinação perfeita, sem falar da diagramação, os desenhos, trabalhadas de maneira eficaz.
2. ANÁLISE E RESENHA
2.1. Conceitos preliminares - Começando a nossa conversa
A obra remete-nos ao valor da essência humana como grande pano de fundo, porém, desta vez, mais abrangente, especial. Em análise apresento o poema “Já tentei calar-me”, da página 38, onde o sujeito lírico busca, através de um diálogo íntimo com a alma, o real sentido do viver; em alusão ao primeiro ano desde o lançamento do livro EU.
2.2. Desenvolvimento - Continuando a nossa conversa
Prioritariamente vale ressaltar que, o modo lírico é um tipo de texto de carácter subjectivo centrado na primeira pessoa, embora esta pode variar entre o tu e o nós, a emancipação de um sujeito/eu lírico que exterioriza o seu mundo interior, o que nalguns casos é confundido com a própria pessoa do autor, quando na verdade são entidades diferentes, convém-me citar Yves Stallone, fazendo a referência à concepção do eu lírico "… o lirismo é a emanação de um eu – que o romantismo gostava de confundir com a pessoa do poeta, mas que pode se apagar por detrás de uma de suas personagens." (STALLONE, YVES. Os géneros literários. Rio de Janeiro: Difel, 2001, p. 151). Sendo duas entidades diferentes (autor – real, e eu lírico – personagem/criação), o sujeito lírico pode apresentar-se em diversas formas, sempre dependendo do autor, como é o caso do texto em análise, escrita por uma mulher, porém, sentimentos exteriorizados por um eu indefinido.
A autora brinda-nos com uma escrita terna, acentuada num eu que congrega todos os pronomes pessoais, sem alguma excepção, enfatizando as diversas imponderações que o ser humano recria no seu interior, fruto de suas leituras daquilo que é o mundo exterior, entre o ser extrovertido e introvertido, e o título como parece, faz jus ao texto.
I. Organização do poema
O poema é composto por 17 versos, repartidos em 2 estrofes, livres e compostas de acordo a estrutura:
1ª Estrofe – Décima, 10 versos;
2ª Estrofe – Septilha, 7 versos.
II. Natureza do poema
a) Género
Tal como a definição dos géneros literários, o género lírico também ganhou diferentes definições, logo, temos os poemas do tipo narrativo, lírico e dramático, possuindo características diferentes. Assim, pela análise, o poema é do género lírico.
b) Forma
Talvez seja a hora de falar do soneto, da balada, do rondó, das oitavas, sextinas, os haicais, a trova ou outro poema de forma fixa, mas não, o poema não obedece qualquer regra fixa, é um poema livre, lapidada como a Nallene melhor forja, tal efeito concede um grande ênfase na essência da poesia. A maioria dos poemas da autora escrevem-se nesse estilo, sem forma fixa, uma composição em diversos formatos, desde a estrutura dos versos, métrica, estrofe e rimas.
Nos aspectos da linguagem, na sua composição, a subjectividade em volta do texto, carrega a metáfora como grande figura de estilo ao nível semântico, assonância, aliteração e a própria rima, ao nível fónico.
c) Métrica
O poema possui versos heterométricos, possuindo medidas diferentes, desta feita, verificamos a segunda estrofe do poema, a septilha que abre com um verso irregular (verso de 14 sílabas poéticas), avançando com um decassílabo (verso de 10 sílabas poéticas), a seguir um eneassílabo (verso de 9 sílabas poéticas), eneassílabo (verso de 9 sílabas poéticas), decassílabo (verso de 10 sílabas poéticas), hendecassílabo (verso de 11 sílabas poéticas) e fechando com um eneassílabo (verso de 9 sílabas poéticas). É possível notar que, os versos regulares, predominam no poema.
d) Rima
O estilo rimático do texto apresenta duas variedades, vale ressaltar de que a rima não se centra propriamente na semelhança de letras no interior ou no final do verso, mas sim, a de sons. As rimas aqui postas, sonorizam-se de forma natural, sem forçar a harmonia do texto, assumem um único estilo, ou seja, monorimas, no caso da segunda estrofe - diferente da primeira, que é mista -, voltando na mesma, encontramos as seguintes variedades:
- Quanto ay posição: rima externa;
- Quanto à fonética: rima perfeita;
- Quanto à acentuação: rima esdrúxula;
- Quanto ao valor: rima rica.
2.3. Considerações finais - Terminando a nossa conversa
As palavras falam além daquilo que imaginamos ser, “Já tentei calar-me” é um poema simples e inspirador, fácil de ler e interpretar, reflecte o amor à vida como corpo poético, o eu lírico faz uma introspecção ao âmago do sentido do viver e da própria vida, encontrando em si mesmo as respostas precisas, e uma força que surge além da alma, reverenciando o valor da essência renovada, da conexão com Deus, o entendimento com o próprio ser e com o próximo, como um triângulo perfeito para uma vida sólida e digna.
Por um lado, é possível destacar ainda, gratidão à vida como um segundo pano de fundo, compartilhado o agradecimento por cada dádiva e a caminhada sem desistir do processo, apesar de tudo. A última estrofe possui um amplo valor semântico, a meu ver, não pela estética, mas, em especial, pela força de vida que congrega, o elo que se harmoniza com o real sentido do viver, mais pelo toque cristão - presente em toda obra, uma questão de crença na Essência da nossa existência e em nossa própria Essência; sem dúvidas, é o mais tocante e inspirador entre os versos.
EU é uma obra repleta de textos marcantes, o poema em referência não é o único marcante, cada escrito carrega a seu próprio impacto, voltarei com outros textos. Até aqui, resta-me dizer: recomendo, recomendo a obra. Vale a pena ler EU, um dos melhores livros que já li e tenho lido.