"Eneida" em forma de romance

 

ENEIDA EM FORMA DE ROMANCE

Miguel Carqueija

 

Resenha de “Eneida”, poema épico de Virgílio, edição em forma de romance. Editora Nova Cultural Ltda., São Paulo-SP, 2003. Tradução: Tassilo Orpheu Spelding.

 

Virgílio (70-19 A.C.), natural da Gália Cesalpina, é um dos poetas romanos clássicos. Sua obra póstuma, a “Eneida”, é uma das continuações da “Ilíada” de Homero, que narra a Guerra de Troia.

Se a “Odisséia”, também de Homero, narra a volta de Ulisses para sua casa, a “Eneida” se ocupa com Enéias, guerreiro troiano que com seus companheiros foge para a Itália afim de lá se estabelecer.

É o segundo poema épico que eu tenho o desprazer de ler em forma de romance; o outro foi a “Odisséia”. Desconfio portanto que ainda não li essas duas obras. Foi preciso mexer nelas para transformá-las em romances.

Infelizmente a editora nada esclareceu sobre a adaptação.

De qualquer forma a história me parece muito indigesta. Tem tanta violência seguida, com crueldade e ausência de compaixão, que faz lembrar os “Cavaleiros do Zodíaco”.

Há uma verdadeira enxurrada de nomes de personagens mitológicos ou relacionados com os poemas de Homero. Personagens que aparecem na trama, inclusive meteoricamente, ou são mencionados: muitos morrem. É, de resto, impossível conservar intacto o fio de meada. O personagem central, Enéias, é várias vezes chamado de “pio”(piedoso) e ele nada tem de santo; pelo contrário, é sanguinário. E, finalmente, as interferências dos deuses do Olimpo são irritantes.

Eu confesso que não tenho muita paciência com histórias que envolvem deuses pagãos, pela gratuidade dos mesmos. Nas crenças mitológicas existem deuses mas não existe Deus. E esses deuses são limitados no tempo e no espaço, não passando de super-seres, como os heróis DC e Marvel.

O principal adversário de Enéias é um sujeito chamado Turno. A batalha entre os dois porém é desigual, por causa da interferência dos intrometidos deuses, que favorecem Enéias.

Só para terem ideia do domínio da violência nesse livro, eis um pequeno trecho na página 286:

“Cédico prostra Alcátoo, Sacrato mata Hidaspes e Rapo Partinio e o muito rude e robusto Orses. Messapo derruba Clônio e o licaônio Eriquetes: aquele, derribado por terra pelo cavalo desenfreado, e este, que estava a pé, pelo que estava também a pé. O lício Ágio passara à linha da frente, mas é prostrado por Válino, não desprovido do valor de seus antepassados; também Sálio derruba Nealces, insigne no tiro de dardo e da flecha que de longe engana.”

É um livro cansativo, cuja narração de violência contínua enjoa.

 

Rio de Janeiro, 1º e 18 de fevereiro de 2024.