A Fundação e o Império
A FUNDAÇÃO E O IMPÉRIO
Miguel Carqueija
Resenha do romance de ficção científica “Fundação e Império”, de Isaac Asimov. Livros do Brasil, Lisboa-Portugal, Colação Argonauta 86, sem data. Tradução de Alfredo Margarido. Capa: Lima de Freitas. Título original norte-americano: “Foundation and Empire”.
A Coleção Argonauta, surgida nos anos 50 e que durou décadas, deixou saudade e pouca gente conseguiu todas as suas centenas de volumes. Isaac Asimov, russo-americano e autor também de livros de
divulgação científica, apareceu com frequência.
Muitas de suas obras são fascinantes, como os contos da Doutora Susan Calvin, psicóloga de robôs. Asimov é autor das Três Leis da Robótica, até aqui fictícias, que estabelecem: 1) um robô não pode fazer mal a um ser humano ou, por omissão, deixar que ele sofra algum mal; 2) um robô deve obedecer a um ser humano, a não ser que isso contrarie a Primeira Lei; e 3), um robô deve zelar por sua própria sobrevivência, a não ser que isso contrarie a Primeira e a Segunda Lei.
Como na vida real os robôs nem sabem que existem, isso permanece no domínio da ficção.
A saga da Fundação é bem menos interessante. Passa-se num futuro extremamente distante, onde a humanidade se expandiu pela Via Láctea, criando um imenso império cósmico. E como esse império (em si absurdo) começa a entrar em decadência, aparece um sujeito, Hari Seldon, que desenvolve a chamada psico-história, com a qual pretende adivinhar o que vai acontecer nos próximos séculos e criar os mecanismos para salvaguardar a civilização humana.
Em resumo, um messianismo sem Deus (Asimov era ateu). Uma Via Láctea onde só a humanidade existe como raça inteligente. Aliás nem sobre animais ou paisagens naturais se fala. Parece o paraíso utópico dos socialistas, com seu messianismo imanente.
No entanto as preocupações dos personagens deste romance (o segundo da saga) permanecem a nível mesquinho, com guerras, política de conquista, dinheiro. A visão social de Asimov é anacrônica, com as mulheres em segundo plano ou nem aparecendo, um imperador sem família...
Hari Seldon, morto a séculos mas que reaparece de tempos a tempos em hologramas que deixou gravados, planejou a tal Fundação para preservar a herança da civilização e esperar a queda do Império; e ainda planejou a Segunda Fundação no outro lado da Via Láctea, como reserva de segurança. Só não previu o aparecimento do Mula, um mutante dotado de poderes psíquicos e que se torna um Napoleão da Galáxia, numa sucessão impiedosa de conquistas.
Quanto às mulheres, aparece apenas uma, Bayta (sic), que adquire muita importância na história, nos capítulos finais, mas é somente ela. A única personagem feminina.
O romance é enfadonho, superficial, extraordinariamente inverossímil; podemos, por suspensão da incredulidade, aceitar as viagens em velocidade ultra-luz; mas admitir a presciência de Hari Seldon por meios puramente imanentes — pois Asimov mantém tudo a nível puramente imanente — aí realmente é difícil de engolir. O ser humano não pode prever o futuro por meios puramente materiais, além de estritos limites lógicos.
Rio de Janeiro, 14 de janeiro de 2024.